terça-feira, julho 31, 2007

Rediscutindo a Guerrilha do Araguaia!!!

Neste último fim de semana em Recife, o Jornal do Commércio publicou extensa reportagem com sobreviventes da Guerrilha do Araguaia, onde se discute os erros e acertos daquele movimento armado do PCdoB contra a ditadura. Acompanhem e participem desta discussão. Enquanto isto ainda cobramos das Forças Armadas e do governo explicações e solução para o problema dos desaparecidos, os mortos e os atingidos pela repressão.

ARAGUAIA, A REBELIÃO QUE MAIS ASSUSTOU OS MILITARES

Publicado em 29.07.2007
Ayrton Maciel A ditadura de 64 era o inimigo imediato, mas o movimento era revolucionário. O objetivo era declarar uma guerra popular, a partir da guerrilha rural, levando a insurreição do campo às cidades. Dos 76 guerrilheiros, 58 são declarados mortos ou desaparecidos, 18 sobreviveram (desertaram ou foram presos), 12 estão vivos. Cerca de 30 camponeses se incorporaram e são tidos como mortos ou desaparecidos. É o balanço do movimento armado que mais assustou os militares. A Guerrilha do Araguaia, deflagrada pelo PCdoB em 72 – entre o sul do Pará e o norte de Goiás, hoje Estado de Tocantins –, completa 35 anos. Os ex-guerrilheiros Zezinho do Araguaia, Pedro e Teresa Albuquerque e Dagoberto Alves Costa reencontram-se no Recife e revivem os momentos na selva, em entrevista publicada hoje e amanhã.

O REENCONTRO
MICHÉAS GOMES DE ALMEIDA (ZEZINHO) – “Nasci em Capanema, no Pará, e vivi parte de minha juventude na Ilha do Marajó. Estive com José Porfírio (de Souza, líder camponês) em Trombas e Formoso (revolta camponesa, na década 50, no norte de Goiás) e na construção de Brasília. Tenho 70 anos, 45 de PCdoB e fui parar na Guerrilha do Araguaia. Lá, eu retirei a Criméia (Almeida), quando ela ficou grávida, retirei o João Amazonas, no primeiro ano (1972) e, depois do último combate, retirei o que sobrou da guerrilha, levando para São Paulo o Ângelo Arroyo. Eu tinha visto a Tereza e o Pedro Albuquerque em 71, e daí nunca mais. O reencontro agora foi uma emoção. Na Comissão de Anistia, em Brasília, vi Dagoberto e revi a Regilena (da Silva Carvalho, a Lena, que desertou em julho de 72 e foi presa), José Genoino (Neto, o Geraldo, preso em abril de 72, hoje deputado federal pelo PT de São Paulo), Danilo (Carneiro, o Nilo, que desertou em abril de 72 e foi preso) e Luzia (Reis Ribeiro, a Lúcia, que desertou em junho de 72 e foi presa)”.



PEDRO ALBUQUERQUE NETO – “Militei sempre nos partidos comunistas. Inicialmente, no Partidão (PCB), em Fortaleza, onde nasci. Em 66, no movimento estudantil, passei a militar no PCdoB. Na ida para o Araguaia (1971), era estudante de Direito na Universidade Federal do Ceará, mas fui expulso em 1970, num ato arbitrário do reitor. Aí, entrei para a clandestinidade. No Araguaia, Teresa (Teresa Cristina Albuquerque, a Ana) engravidou. Saímos em 1972, ano em que nasceu a (filha) Isabela”.


TERESA CRISTINA ALBUQUERQUE – “Nasci no Recife e comecei a militância no movimento estudantil, pelo PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário). Eu estudava sociologia, fui presa em 1971 no Alto José do Pinho, em Casa Amarela , e condenada a seis meses, mas saí com 15 dias. Na época, a orientação do PCBR foi a de que os militantes fugissem, pois começara a fase da tortura. Fugi para Fortaleza. Lá, rompi com o PCBR e ingressei no PCdoB, época em que conheci o Pedro, casamos e o partido nos mandou para o Araguaia, em 1971”.


DAGOBERTO ALVES COSTA – “Nasci em São Luiz do Maranhão. Eu era universitário no Rio e pertencia ao PCdoB, quando fui enviado ao Araguaia. Cheguei lá em abril de 1972. Desci do ônibus com o Adriano (Fonseca Fernandes Filho, o Chico), em Xambioá, e fomos esperar o nosso contato, o Jorge, que era o Bergson Gurjão. Quando ele chegou, nos disse para pegar tudo e sair imediatamente, porque o Exército estava na área. A luta tinha começado”.


AÇÕES

ZEZINHO – “Em maio de 1972, nos dividimos depois da primeira ação anti-guerrilha das três Forças Armadas, que chegaram pelo sul do Pará. O primeiro destacamento a ser atacado pelos militares foi o A, no Bico do Papagaio, região do Fortaleza, em 72. Foi quando o (José) Genoino, lá no Gameleira, recebeu a missão de avisar o destacamento C, nos Perdidos, com o Paulo Rodrigues, para que se infiltrassem na mata. O Paulo perde o contato com a Comissão Militar, demora muito tempo a restabeler e, nessa confusão, foi preciso retirar um grupo da direção. Fui escolhido para retirar o João Amazonas. No ano de 1972, chegam a Rioko (Kaiano, esposa de Genoino), o Eduardo (Monteiro Ferreira) e a Elza (de Lima Monnerat, dona Maria). Em 1973, a Criméia (Alice Schmidt de Almeida, a Alice) engravida e eu a retirei da área. Depois, a Rioko é presa em Marabá, a Regina vai para um hospital em Anápoles e de lá segue para São Paulo. Eu era responsável por inserir as pessoas (guerrilheiros) na mata. Eu apanhava as pessoas e fazia a entrada e saída da região, junto com o Líbero Giancarlo Castiglia (o Joca), eu por uma rota e ele por outra”.


DAGOBERTO – “Nosso acampamento seria o do Gameleira, destacamento B, em Xambioá. Lá , conheci Dina (Dinalva Conceição Oliveira Teixeira, subcomandante do detacamento C), Antônio (Guilherme Ribeiro Ribas, o Ferreira), Zé Francisco (Francisco Manoel Chaves, Seu Francisco), Luzia (Reis Ribeiro, a Lúcia), Paulo Rodrigues (o Paulo, comandante do destacamento C), Dower (de Moraes Cavalcante, o Domingos), Comprido (Cilon da Cunha Bueno), o Tobias (Pereira Júnior, o Josias). Da minha chegada à prisão foram 60 dias”.

ZEZINHO – “A primeira incursão do Exército foi em 1970 (a guerrilha do PCdoB não tinha sido descoberta, mas havia outras organizações armadas na região). Começou por Tucuruí, passou por Marabá e chegou a São João do Araguaia, uma extensão de 100 quilômetros. Nós estávamos fazendo o levantamento do Maranhão para completar com o norte de Goiás, até chegar ao Araguaia, no sul do Pará. Antes da divisão em destacamentos, um grupo estava na Gameleira, outro no Castanhal e outro nos Perdidos”.


“DECISÃO GRAVE”

PEDRO – “Chegamos em 1971 (ele e Teresa Albuquerque), passamos nove meses, mais saímos antes da eclosão de combates. Ficamos no destacamento C, da Cigana, que era o maior grupo. Foi um fato grave, importantíssimo naquele momento, quando decidimos deixar a guerrilha, quando a Teresa ficou grávida. Como o partido decidiu não retirar Teresa, nós decidimos sair (sem autorização). Voltamos para Fortaleza, onde fui preso cinco dias antes da Isabela nascer”.


TERESA – “Com a gravidez, decidi que, se eu estava lutando por um mundo melhor, não poderia jamais abortar um filho, mesmo compreendendo o partido, que por questão da segurança dizia que eu não poderia ter um bebê na guerrilha. Decidimos que iríamos ter esse filho. A partir daí, comecei a planejar a fuga. Eu tinha uma orientação geográfica muito boa, ia para os treinamentos sabendo situar-me”.


PEDRO – “No mesmo dia em que chegamos no campo, foi dito que estávamos em um campo de guerrilha. Teresa imediatamente disse que ali não ficaria, que não sabia que tinha ido para aquilo. Ela tinha pouco tempo de partido, diferentemente de mim, tão ligado ao PCdoB que não importaria em dar minha vida naquelas circunstâncias, mas a gravidez nos forçou a uma decisão grave, a de abandonar a guerrilha. Eu não sabia que estava indo para a guerrilha. O que o partido decidisse, eu faria, mas eu achava que íamos fazer um movimento de massa. Estive com o João Amazonas e aceitaria qualquer decisão, ir para onde ele fosse. Mas, eu não sabia. O camarada Zé Duarte (dirigente) afirmou que eu ia cumprir uma missão importante para o partido, que eu ia sem a Teresa, mas resolveu mandar nós dois. Foi um equívoco. Teresa tinha muito pouco tempo de partido. Trabalhava na organização do PCdoB em Pernambuco e na Paraíba”.


O TREINAMENTO

TERESA – “A gente aprendeu um pouco a atirar até por questão de sobrevivência, porque a gente tinha de comer animais da mata. Aprendemos a atirar de espingarda. E aprendemos tática de guerrilha, de como chegar nos locais sem fazer barulho, dormir na mata para saber olhar na escuridão”.


PEDRO - “O treinamento era mais tático e de adestramento. Não foi muito intenso (nos nove meses). Tanto que ao ser transportado de barco (depois de preso em Fortaleza, foi levado de volta ao Araguaia para identificar pessoas e áreas), os militares me deram uma beretta para que eu a armasse. Eu a armei virada para um militar e aí eles disseram que eu queria matar o soldado. Não era essa a intenção”.


TERESA – “A minha idéia de mudar o mundo era através da educação, porque eu era educadora. O partido deu a entender que a gente ia para o interior e eu iria ser professora, trabalhar com as mulheres, a organização, tanto que eu fiquei como professora lá”.


ZEZINHO – “A área onde ela e a Áurea (Elza Pereira Valadão) lecionaram ainda está lá. Fica em Boa Vista, nome mudado pelos militares para tirar o nome de Caiano, batizado por Paulo (comandante) no igarapé Caiano”.

O INÍCIO

ZEZINHO – “Quero esclarecer um ponto que é meio obscuro. Nós não conseguimos concluir o trabalho de levantamento (na área do Araguaia). Estávamos ainda no trabalho quando fomos atacados. Eles eram os companheiros que estavam começando a sentar as bases necessárias para o movimento futuro. Quando aquilo aconteceu, não tínhamos mais como recuar. Naquele momento, em 1972, lembro que quando reunimos todos os companheiros, o Osvaldo (Orlando Costa, o Osvaldão, comandante do destacamento B) disse: ‘chegou o momento dos mais difíceis para nós. Não conseguimos nem nos abastecer do tempo que necessitávamos, mas o povo brasileiro nas cidades está precisando que nós seguremos aqui o tempo que for necessário a ditadura’. Eram jovens com pouco tempo de preparação, sem armamento nenhum, só espingarda, e nós resistimos. Foram três anos de resistência. Resistir foi o suficiente para desgastar o regime”.
































O incômodo de ser acusado de delator
Publicado em 29.07.2007


A deserção da guerrilha em 1972 deixa até hoje o ex-guerrilheiro Pedro Albuquerque no foco da polêmica sobre a derrota da Guerrilha no Araguaia. O hoje sociólogo cearense é apontado pelo PCdoB como um dos delatores do movimento. O relatório Ângelo Arroyo, comandante da Comissão Militar do Araguaia e membro do Comitê Central do partido, dirigido ao próprio comitê, depois da eliminação da guerrilha, cita Pedro como o que teria entregue a guerrilha. Pedro desmente. Preso em Fortaleza logo depois da fuga com a esposa grávida, Teresa, Pedro foi torturado e levado de volta pelos militares ao Araguaia. Arroyo – último a ser retirado por Zezinho do Araguaia da região – acusa as delações de presos e desertores como um dos fatores da queda. Os outros seriam a precária comunicação entre os destacamentos e entre a guerrilha e o partido e a deficiência de armamento. “A saída foi uma decisão muito difícil, que me toca muito mais do que uma notícia de que entreguei a guerrilha”, ressalta Pedro.

A SUSPEITA
PEDRO - “Eu achava que eles já não estavam mais me vigiando (na volta a Fortaleza), trabalhava clandestino como corretor e fui a uma delegacia tirar minha identidade para um emprego no Laboratório Roche, em terezina. Na polícia, fui preso. A partir daí, fiquei no centro da discussão sobre o Araguaia, no que diz respeito à descoberta do movimento. Eu fui acusado pelo camarada Ângelo Arroyo no relatório que ele fez sobre a guerrilha para o partido, como tendo sido a pessoa que teria entregue a guerrilha. E as forças de informações militares se encarregavam de propagar que eu tinha sido delator. Toda a vida desminto isso. A guerrilha já era do conhecimento deles. Vimos a passagem de agentes do Exército com retratos de pessoas”.


DAGOBERTO – “Eu, Danilo, Luzia, sabemos disso. Eu tive conhecimento de documentos de várias organizações, ALN (Ação Libertadora Nacional), VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), Colina (Comando de Libertação Nacional), VAR–Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária). No movimento estudantil, sabíamos que muita gente estava se deslocando para aquela área, e isso era do conhecimento dos serviços de informação. Antes da descoberta do foco (do PCdoB), membros de outras organizações foram presos e falaram. Os militares não sabiam quem eram as pessoas, mas sabiam que existia alguma coisa. Disseram isso a mim e a Danilo nos interrogatórios, que estavam há muito tempo sondando a área. Coletando informes chegaram ao núcleo do PCdoB. No momento em que cheguei, o Exército já tinha feito as primeiras incursões. O pessoal que estava no destacamento de Gameleira, como o Genoino, escapou em questão de minutos à chegada da tropa. O traçado da Transamazônica mostra que queriam impedir qualquer movimento guerrilheiro e permitir a entrada rápida de tropas. Abriram em poucas semanas a PA-70. Em Xambioá, construíram um aeroporto para aviões Búfalos (transporte de tropas) e desembarque de fuzileiros. Ângelo errou. Não houve isso (a traição)”.


ZEZINHO - “O caso de Teresa e do Pedro foi um momento muito importante para a aprendizagem da guerrilha. Houve o caso do Amaro Lins (Francisco), que pediu à direção para não entrar na mata, porque a sua companheira Neuza estava com um filho e precisava do apoio fora. Ele ficou. Depois, teve o caso de Pedro e Teresa, e aí aparece o caso do Danilo, que diz ao comando que não tem estrutura para ficar, pede para sair e ajudamos ele a sair. Era característica da guerrilha segurar a pessoa que não tinha convicção do que estava fazendo. Eu não admito que ninguém tache qualquer companheiro da guerrilha de traidor”.

AS TORTURAS


PEDRO – “Em função das torturas que sofri, passei momentos longos de alucinação. Em um desses, ainda no Pelotão de Investigações Criminais (PIC), em Brasília, disse aos soldados: ‘quero falar com o comandante, quero falar com o comandante’. Quando me levaram, lembro que estava à mesa o general Hugo Abreu, em meio a generais. Tentei recuar, mas saiu uma reflexão. Eu disse: ‘acho que o movimento do Araguaia é uma tentativa de se estabelecer uma zona liberada e isso ser reconhecido na área internacional, principalmente pela China’. Aí, o Hugo Abreu quis aprofundar a questão. Eu demonstrei que era um movimento de conteúdo nacional, a questão de criar um Brasil soberano era o foco. O Hugo Abreu disse: ‘fale mais meu filho, fale mais’. Naquele momento, fiquei confuso, até porque não tinha como me aprofundar. Agora, se os militares sabiam, por que não entraram logo? O Brasil é uma País importantíssimo na América e os militares tinham uma idéia de nação grande e forte, capitalista e moderna. Para isso, a relação do Brasil no campo internacional era muito importante. Acho que eles se dividiram: uns ficaram na extrema direita, o pessoal menos culto, defendendo que se invadisse logo para acabar o foco, outros, preocupados em ser discretos, para não abrir uma frente de luta na Amazônia, evitando assim condições internacionais desfavoráveis. Se o Brasil demonstrasse uma situação de deflagração, poderia afetar a segurança dos investimentos internacionais”.

A ACUSAÇÃO

PEDRO – “A saída (do Araguaia) foi uma decisão (de Teresa e) também minha. Isso foi deixado muito claro para o partido. Teresa disse logo que chegou que iria sair, disse ao Gilberto (Olímpio Maria, ao Pedro Gil, comandante do destacamento C), membro da Comissão Militar e genro do Maurício Grabois (Velho Mário, comandante-chefe das forças guerrilheiras). Quando Gilberto disse ‘daqui nós só saíremos vivos (vitoriosos) ou mortos’, Teresa reagiu: ‘quero dizer que não vim para isso, eu não sabia disso e não estou preparada para isso, e aqui não vou ficar’. Eu sempre estive ao lado dela, embora no caminho eu quisesse desistir. Foi uma decisão muito difícil, que me toca muito mais do que alguma notícia dizendo que eu entreguei a guerrilha, porque eu tenho certeza que não foi”.


DAGOBERTO – “Vocês não tiveram nenhuma responsabilidade sobre isso. Lembro-me que meses depois de preso ali no Pelotões de Investigação Criminais, em Brasília, uma vez o general (Antônio) Bandeira chamou a mim e ao Dower até a sala do comando. Havia outras autoridades militares. Sobre a mesa, toda a literatura disponível em português e espanhol sobre a Amazônia. Ele disse: ‘nem pensem que nós não sabemos onde estamos’. Quando voltaram para a segunda incursão, não sobrou nada. Não tivemos o apoio que teoricamente deveríamos ter tido, uma área segura para que as forças pudessem se recompor”. O relatório do Ângelo (Arroyo) foi uma coisa feita em um aparelho, sob o sufoco, não reflete realmente (o que aconteceu). Foi um negócio muito emocional, fruto de uma grande frustração que aconteceu com todo mundo, por a coisa não ter dado certo. Quando O Pedro foi preso, os militares já estavam na área”.

Inspiração em Mao e nos rebeldes de Trombas e Formoso
Publicado em 29.07.2007


Inspirada na teoria da guerra popular prolongada de Mao Tsé-tung, a Guerrilha do Araguaia teve também um elo nacional, a revolta camponesa no meio-norte do Estado de Goiás, conhecida como a Guerrilha de Trombas e Formoso, a 470 quilômetros ao norte de Goiânia. Um movimento em meados da década de 50 que assumiu a posse da terra e foi o poder político na região, o que se prolongou até 1964, quando o Exército ocupou a área e liquidou a organização.
A revolta camponesa de Trombas e Formoso – referência aos rios que cortam a região – teve como principal personagem José Porfírio de Souza, o Zé Porfírio ou Profiro, como era conhecido no linguajar da população o líder camponês. Com a adesão de estudantes e militantes do PCB, os camponeses combateram e venceram jagunços e tropas policiais aliadas de latifundiários e grileiros de terras, que contavam ainda com a cumplicidade de juízes corruptos.

“Estive com Zé Porfírio em Trombas e Formoso. Camponeses (os mais velhos) que participaram da Guerrilha do Araguaia estiveram lá, onde se formou a república (camponesa), com camponeses armados para resistir. A resistência se dava nas associações de posseiros em Minaçu, Campinaçu, Santa Tereza, Porangatu, São Miguel, em toda a região tinha associação de posseiros, pequenos estados dirigidos por camponeses, e com sua força armada que garantia o poder político. As estradas eram ruins, até para passar carro de boi. Dali, nasceu a Guerrilha do Araguaia em 1972”, relembra Micheas Gomes de Almeida, o Zezinho do Araguaia, vinculando os movimentos.

Organizados em associações, os camponeses de Trombas e Formoso passaram a planejar a produção e comercialização de seus produtos. Em 1960, Zé Porfírio torna-se o primeiro candidato camponês do Brasil a se eleger deputado estadual. Cassado e preso pela ditadura militar de 64, “Profiro” desaparece. Permanece até hoje na relação dos desaparecidos políticos.

Militante do Partidão (PCB), Zezinho revela que em Trombas e Formoso já apareceriam a divisão e a luta ideológica entre os comunistas brasileiros – desencadeada a partir de 1955 – com as deliberações do 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética, que condenou o stalinismo (a linha de Josef Stalin). “O movimento comunista em Trombas e Formoso divergiu da coexistência pacífica e colaboração de classe. Como coexistir pacificamente? Ali foi que começou a luta interna do PCB, que adotou as decisões do PC soviético. Isso culminou no afastamento dos dirigentes que divergiam e em 1962 surge o PCdoB”.

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