Harmonizar lutas de ideias, de massa e eleitoral no PCdoB de hoje
Parte 1
Secretário Sindical do Distrito Federal e membro da Comissão Sindical Nacional
O PCdoB sobreviveu ao revisionismo e ao liquidacionismo graças ao sacrifício de
destacados camaradas, uma tarefa hercúlea, sob a clandestinidade, o isolamento e o extermínio.
Tantos heróis e heroínas a sepultar, verdades a saber, e o Partido, de pequenino, foi-se ampliando,
por sagaz, habilidoso e combativo. É animador haver mais de 300 mil filiados! É um desafio
manter-nos à altura de nossa História, o que nos obriga a pensar grande. E o Partido que temos
dependeu da firmeza com que enfrentamos o tsunami neoliberal que varreu o mundo com a Queda
do Leste Europeu. O PCdoB disse: “O tempo não para, o Socialismo Vive”, no 8º Congresso.
E nos últimos dez anos, conquistamos mudanças na situação de defensiva que abrem uma
nova luta pelo socialismo, e nosso Novo Programa. O último decênio trouxe novos Estatuto e
Política de Quadros. Ademais, um balanço histórico das quatro gerações comunistas no Brasil que
engrandece o Partido, que retoma Prestes em nossa história e afirma o papel imprescindível de João
Amazona, Pedro Pomar e Maurício Grabois, artífices da resistência que legou ao Brasil o seu
Partido Comunista.
Poder-se-ia esperar, em tão pouco tempo, fôssemos todos comunistas, formados? Não o
creio. Por isso a centralidade na ampliação do Partido das bússolas que orientam-nos no nevoeiro da
luta política para mudar o Brasil. Ao mesmo tempo, elas definem nossas feições: Partido amplo,
mas de classe, e assentado em quadros e militantes; com liberdade de opinião individual, mas sem
frações; com centro único de direção e unidade para lutar pelo Brasil, a democracia e o socialismo,
cuja expressão imediata é a consecução de um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento.
As mudanças no socialismo e o papel da formulação do PCdoB
Foi na contramão da defensiva estratégica que avançamos para projetos de poder à
conclusão de que há uma nova luta pelo socialismo, que se dá em meio à crise do capitalismo e do
neoliberalismo e num período de ausência de um novo paradigma. O socialismo hoje dista em
muito do que vigeu no século XX. Nos casos Chinês, Cubano, Vietnamita, Laosiano, é uma
economia mista. Propriedade pública e privada sob o poder socialista. E na Venezuela predomina o
capitalismo, a despeito dos esforços da Revolução Bolivariana.
Isso causa grande confusão ideológica. Vige ainda a idealização da estatização nas
experiências socialistas do século XX. O fenômeno com forte motivação militar, por um lado, e
pela visão de modelo único de socialismo a partir da Europa. Não tenho dúvida de que o avanço do
nazi-fascismo levou ao imperativo da militarização na URSS.
No período anterior, a opção criadora de Lênin, na década de 20, pouco antes de sua morte,
propondo a Nova Política Econômica. A prioridade Soviética era um projeto nacional de
desenvolvimento que integrava as propriedades públicas e privada, joint ventures, capital externo,
cooperativas e a empresa privada visando ao capitalismo de estado como ante-sala do socialismo,
uma sociedade superior ao capitalismo, superando o atraso econômico, com a vigência de relações
feudais, mercantis atomizadas e do mercado ilegal.
O aprendizado da experiência chinesa levou Deng Xiao Ping a relançar as ideias de
prioridade no desenvolvimento nacional, a partir de formas mistas de propriedade para emular a
economia, reconhecendo sérios limites à inovação apenas sob o Estado e se propondo
deliberadamente a incorporar as tecnologias mais diversificadas em um ritmo acelerado de
crescimento econômico. O socialismo em países sob atraso tecnológico e econômico, ameaçados
militarmente, exige prioridade às tarefas do desenvolvimento, com o poder socialista sendo seu
guardião, com feição mais ou menos estatal, segundo muitos fatores. É, hoje, uma política de paz e
de desenvolvimento econômico.
Se lá é complicado, aqui não é menos. O desenvolvimento é prenhe de tensões, inclusive
internacionais, já que o as potencialidades ameaçam as pretensões dos EUA. São também conflitos
sociais a ser mediados, nos quais nem sempre o governo está certo. Há grandes críticas a como se
lida com tais conflitos, que exigem harmonizar temas complexos e interesses contraditórios.
Vivemos no capitalismo. Lutamos por um desenvolvimento que valorize o trabalho, seja
sustentável e integrado à América Latina, que acabe com a pobreza extrema e amplie a democracia.
São grandes as potencialidade do Brasil e é preciso que o país se desenvolva rapidamente, no
quadro de uma situação internacional instável, marcada pela crise do capitalismo e pela ferocidade
Desenvolver-se é afirmar a nossa soberania, educar todo nosso povo, não permitir nenhum
brasileiro na miséria. Para isso será preciso uma outra taxa de investimentos. E é escandaloso que o
tripé macroeconômico do neoliberalismo siga ainda vigente, cobrando inacreditável fatia do
orçamento para o rentismo. No entanto, no curso de um período de renovação de portos, aeroportos,
estradas, arenas esportivas e obras de transporte, dos grandes eventos esportivos, com a
possibilidade de exploração do Pré-Sal e com um mercado interno com muito para crescer, e com
bônus demográfico. A juventude, através da educação e do trabalho, pode cumprir um papel
decisivo como uma geração que conquiste o desenvolvimento no Brasil.
Nesse contexto é que se pergunta se é correta uma aliança de classes que isole o
parasitismo rentista e abra caminhos à expansão – sob o capitalismo – de um novo ciclo de
desenvolvimento brasileiro, com crescimento a taxas robustas, com avanço das tecnologias, da infra-
estrutura, da indústria brasileiras. Nessa visão, o que une essa aliança é uma perspectiva nacional e
anti-imperialista. No NPND, qual o lugar deve ocupar o investimento privado? No rentismo ou na
produção (e nela nas obras de infra-estrutura)? Ou em nenhum lugar? É inescapável na presente
quadra, uma política de concessões. É preciso esclarecer melhor o tema para o conjunto do Partido,
clareando suas motivações e fronteiras. Há, claramente, divergências e pouca clareza sobre o tema e
sua importância nacional. Isso é ainda mais grave para as necessidades de investimento na Defesa e
em nossas Forças Armadas.
A defesa do Partido em meio aos desafios atuais
A defesa de uma economia mista até no socialismo e as alianças para o atingir não
justificam aceitar mudanças no caráter do Partido que somos. Há renovação e permanências.
É muita novidade. Dúvidas se expressam sobre o sentido da militância. Na esquerda persiste
grande confusão quanto ao caminho a seguir. Valoriza-se o papel do Partido na presente quadra de
dispersão de forças. Mas há desencanto quanto a partidos, sindicatos, e à luta coletiva, organizada,
consciente. Há uma campanha de descrença no Brasil e no seu povo trabalhador. E há tentações e
pressões inerentes à relação do estado com o mercado sob o neoliberalismo.
Nosso balanço autocrítico deve conter os dilemas e limites de nossos governos no
relacionamento com nossas bases sociais. Temos ousado, é certo, mas também temos enfrentado
dificuldades em projetar nossa imagem para a sociedade.
Tivemos percalços nesse período. A migração de bases eleitorais, a perda de apoio em
setores, o perfil de nossas lideranças precisam ser melhor tratados. Ações de governo nem sempre
resultaram na sucessão de gestões vitoriosas, como no caso positivo de Olinda. Há uma
singularidade na participação comunista na institucionalidade? Quando deve o partido apoiar uma
medida? Quando votar contra? Quando romper? Não se vinca uma imagem apenas dizendo sim.
Como servir ao povo nesse contexto? Como prevenir-nos das pressões lícitas e ilícitas?
O PCdoB é o partido de sua militância
Num ambiente de descrença e incerteza, somos desafiados a reencantar a militância, retomar-
lhe o sentido abnegado que notabiliza a militância comunista. Num passado recente, queridos e
admiráveis camaradas deram suas vidas por esse ideal que repousa em nossas mãos.
Outra frase de Cazuza, “Ideologia, eu quero uma pra viver”, é cada vez mais necessária num
mundo em crise e transformação. O PCdoB deve zelar por um patrimônio único na política
brasileira: a militância. Você, meu, minha camarada, que ostenta o mais honroso título, segundo
Amazonas: militante do Partido Comunista.
Atrás dessa palavra há muitos significados. Ser comunista significa um ideal de vida. É uma
forma de ver o mundo em favor dos mais pobres e dos oprimidos. É ter uma ética, uma determinada
valorização do coletivo. É ser radical e consequente. Nós não andamos a mudar de partido. Temos a
certeza científica da superioridade da ação e do pensar coletivos, plasmados na teoria como armas
para mudar a realidade, e a temos mudado.
Possuímos uma teoria própria, eficaz, a única que até agora desafiou realmente o poder das
classes dominantes. E há uma camaradagem entre nós, reconhecemo-nos porque agimos segundo
certos princípios e um programa. É graças a isso que, de ouvido, em qualquer luta, identificamos:
está aí um camarada. Temos orgulho do PCdoB.
Parte 2
Harmonizar lutas de ideias, de massa e eleitoral no PCdoB de hoje
Sempre há uma solução simples para um problema complexo. Geralmente errada.
Lutas de ideias, social e político institucional eleitoral a serviço do Projeto Partidário
Assim, diante de um momento sem receitas como o atual, aonde ainda vige uma defensiva
estratégica, o PCdoB concluiu pela articulação dialética de três frentes de acumulação de forças
dessa época - luta de ideias, luta de massas e luta político-eleitoral-institucional. E a Tese do
Congresso afirma um pilar fundamental que deve perpassar toda a ação dos comunistas: o
fortalecimento do Partido.
Essas três frentes de acumulação de forças e a estruturação partidária são achados
importantíssimos da inteligência coletiva. Nossas ações devem ter sempre um aspecto de luta,
ideologia (programa) e disputa do poder. E quanto ao poder, diante da inédita duração do atual
período democrático, o Partido precisa conquistar um eleitorado próprio, crescente em relação ao
atual, muito baixo. Eleitorado que depende de nossa liderança na sociedade, de nossos laços com o
Existe essa fatia do eleitorado? Haverá atalhos para o nosso crescimento eleitoral?
Aproveitamos o processo político eleitoral para a disputa de nossas ideias? Há imensas
dificuldades ao debate político no Brasil, mesmo sob essa democracia.
Daí porque o Partido não pode resumir seus desafios à centralidade de uma disputa político-
eleitoral: o caminho de um Partido Comunista não pode nem deve ser o mesmo de um partido
adequado à ordem vigente. O sistema político atual, fruto da Abertura Lenta, Gradual e Segura,
possui limitações objetivas a um crescimento eleitoral dos comunistas. É preciso, para crescer,
influir a partir da luta de massas e da luta de ideias o sistema político, pois não serão recursos nem o
apoio dos aliados que nos valerão. É preciso contar com as próprias forças, com nossos militantes e
quadros, para que possamos crescer eleitoralmente.
Assim, também entre nós se joga a batalha sobre o sentido da política e da militância. Parte
do resultado estará na capacidade de incorporar devidamente as novas filiações numa organização
única, comunista. Sem forte investimento na formação, sem reconhecer os riscos à identidade do
Partido, sem enfrentar a autonomização de grupos de interesse, sobretudo a partir da
institucionalidade, podemos vacilar ante a forte pressão de aliados e do Estado.
Por isso, Programa e Estatuto tem de ser usados para orientar uma prática política e uma
expressão próprias, inclusive em votos. Mas, para isso, devemos ter o cuidado de não confundir a
centralidade de uma batalha, como uma eleição e a mudança na nossa concepção da forma de
acumulação de forças, em favor de uma exclusivização eleitoral. No enfrentamento de 2014 temos
o desafio de disputar ideias, afirmar a identidade do Partido, mobilizar o povo, os aliados, o
movimento social para um papel de vanguarda, integrando todo o Partido numa batalha concreta,
que é eleitoral. Isso não se confunde com uma postura simplista, meramente eleitoral. Resumirmo-
nos a isso é desarmar-nos diante de um jogo em que não dominamos as variáveis centrais: nem lei,
nem recursos financeiros, nem tempo de televisão, nem o judiciário.
Urge entender como o Partido se relaciona com o povo, quem representamos. O Partido
Comunista é o partido do proletariado, da classe trabalhadora. Termos criado a CTB significou um
salto para nosso Partido nessa questão, fato ainda não absorvido em nosso cotidiano. Somos um
vigorosa expressão juvenil em nosso país. Somos um partido de mulheres guerreiras, brilhantes e
protagonistas. Como essa base social pode ser mobilizada antes, para e depois das eleições?
Mas, com todo o realismo, não deve se perder entre os comunistas a perspectiva socialista, o
caráter militante, o lastro de classe e a unidade de ação. É certo que nosso resultado de 2014 se
medirá em votos, mas até o voto há um caminho que só poderá ser percorrido a partir da militância,
dos filiados, numa férrea unidade de ação focada numa batalha que é eleitoral, é certo, mas que
reúne múltiplas determinações, que o mero pragmatismo não dá conta de atingir. A ação dos
quadros exige a noção de totalidade, do concreto como produto de múltiplas determinações. E a
eleição termina, mas a luta continua, com ou sem governo, deputado, ou senador.
O pensamento complexo das três dimensões da luta pela hegemonia, ideias, mobilização
social e a disputa político-eleitoral-institucional ganha profundidade com a noção do pilar de
estruturar o Partido. Por sua riqueza e valor interpretativo, devemos manter assim, sem
exclusivizações, buscando uma harmonia, e deixando claras as fronteiras do nosso compromisso
com o Brasil e os Trabalhadores(as)
A exclusivização de apenas uma maneira de acumular forças e a correlação de forças podem
levar a uma postura pragmática, que secundariza a disputa de ideias na luta eleitoral, que
secundariza uma mobilização organizada da sociedade. E, pior, pode redundar em desgaste público
da imagem do Partido e também em instabilidade na nossa vida interna. O Partido não pode
exclusivizar o poder da representação institucional como a expressão do Partido. A fusão entre
Partido, Estado e Movimento Social se mostrou daninha ao socialismo. Por que ela seria benéfica
para a nossa luta pelo Socialismo no Brasil?
Destaque-se que o sistema político sofre de grande descrédito público. E com razão.
Vivemos uma democracia limitada, submetida ao poder econômico, com uma maioria conservadora
secular e enfrentando o poder midiático, e com uma crescente judicialização da política. Não é à toa
que a luta de massas, com as manifestações a partir de junho mostraram as fragilidades da
exclusivização da ação político institucional, e mais, demonstrou a interpenetração das frentes e a
insuficiência da resposta do governo, do sistema político, e a relevância do nosso movimento social
para as mediações e a proposição de bandeiras que se tornaram vitórias políticas. Nesse caso, a
simplificação é inimiga da eficácia de nossa ação como comunistas.
O Presidente Renato Rabelo não é deputado, senador, prefeito. Mas o carinho e o respeito da
militância pela sua direção e trabalho incansável e abnegado fazem dele o nosso líder, que tem a
maior responsabilidade sobre a unidade e o caráter do nosso partido, mesmo num contexto de uma
direção coletiva. Essas duas virtudes é que constituem os principais requisitos, muito mais
importantes que a representatividade institucional. Nem sempre o institucional será o certo, ou
deverá ter o apoio do nosso Partido ou pode representá-lo. Uma de nossas funções é projetar os
trabalhadores e trabalhadoras, jovens, e a intelectualidade progressista eleitoralmente, como
expressão pública. Não podemos ser um partido em que só se elege quem tem dinheiro. O Partido
Comunista é um lugar de empoderamento do povo.
A atual geração de parlamentares nacionais vem sobretudo dos anos 80 e 90, líderes
estudantis, sindicais, camponeses, mulheres, intelectuais e artistas, militantes políticos. Há algum
nível de desgaste natural de mandatos parlamentares ao longo do tempo, por exemplo, 20 anos. Se
isso não evolui para um patamar distinto, entra em crise. Nosso Partido sabiamente fez a sua
abertura estruturada pelo Novo Estatuto. Busca lideranças do povo para ocupar esse espaço. É uma
parte dessa renovação. Devemos reforçar e aprimorar o acompanhamento político dessas novas
filiações e a gestão de seu potencial – para o bem e para o mal - para a imagem do Partido.
Nesse sentido, uma postura mais proativa que enfrente de modo mais incisivo as polêmicas
em torno da disputa do desenvolvimento é fundamental para podermos enfrentar o debate político
atual n país. Também sofremos ataques diretos da imprensa hegemônica e mesmo de aliados.
Evidencia-se a necessidade de ter uma efetiva gestão de imagem do PCdoB, atual, com as novas
tecnologias e uma visão de comunicação e visual.
Mas, e os líderes do povo que representamos, como temos projetado eleitoralmente as
lideranças populares atuais? Minha opinião é que vivenciamos o fim de um ciclo e que há um
grande espaço político em 2014 para lideranças do PCdoB. Temos de ter vitória, é certo, e não
apenas o voto. Temos que crescer o Partido e dialogar com uma parcela da sociedade possa nos
reconheça, temos de projetar líderes.
Defesa da unidade contra a autonomização de interesses estranhos ao projeto do PCdoB
Por fim, opino que é daninha a formação de grupos de interesse, tendências ou facções no
Partido. Quando temos essa realidade a partir de quem detém posições de governo e mandatos, pior
ainda. Com a centralidade do institucional, a militância é alijada por um poder efetivo, estatal,
estranho ao Partido, vulnerável à cooptação por aliados mais poderosos, como o PT, por exemplo.
Penso, por tudo isso, que o item 118 deve ser emendado, com a seguinte redação:
118 – As vicissitudes são de certo modo inevitáveis para a esquerda. Hoje, atingem não apenas
a frente institucional-eleitoral, mas se manifestam também nos movimentos sociais e na luta de
ideias. Somos desafiados, compreendendo a prioridade das eleições de 2014 para o Brasil e
para o Partido, a saber sabiamente articular todas as nossas forças na frente da luta de ideias,
na luta de massas e na frente político institucional. A militância é essencial para a mediação,
para o lançamento de lideranças com potencial eleitoral e identidade partidária, para uma
mobilização que signifique uma vitória eleitoral, o êxito na comunicação dos comunistas com
o povo e um legado de ampliação da influência política e da estruturação partidária.
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