domingo, março 13, 2011

Encontros e desencontros nas noites paulistanas. E nos dias também!!!






MEMÓRIAS PAULISTANAS 2

Naqueles agitados , tensos e criativos anos chamados de 60, mas que foram até meados de 70 em pleno “Anos de Chumbo”, de fúrias e carnificinas da Ditadura Militar, nós jovens(na época) inquietos e inimigos jurados do Fascismo, também vivíamos intensamente. Liamos muito, de filosofia a romances, fazíamos musica e cantávamos a sede de liberdade, as agruras do povo. Faziamos também filmes e peças de Teatro expressando nosso amor ao povo e as pessoas queridas.

E a gente namorava muito também. Desde as colegas de Faculdade, de trabalho e até gente de Teatro e havia as amigas e simpatizantes de nossa causa maior, como a Kathe Hansen, Sonia Piccinin, Beth Mendes(que chegou a ser presa e torturada por pertencer a base de apoio da ALN), o pessoal do Arena e do Teatro Oficina do José Celso e outras que até entraram na luta por amor ou ideologia.

De Penápolis a Sampa

Para mim as coisas começaram em Penápolis, onde fizemos teatro, cineclubes, discutíamos musica ,cinema e literatura e filosofia, principalmente na casa de “seu” Manoel Lacava e nossa musa e protetora Dona Amélia, que tinha sido também a professora da maioria de nós no grupo escolar e era mãe de dois de nossos companheiros de toda hora, o Celso-Capim que já virou borboleta e Cilô que ainda esta em Sampa repartindo sua vida e cultura e dando aulas.

Por ali também começamos na politica de resistência. Depois nossa turma original debandou para fazer a vida. Alguns para Brasilia e a maioria para São Paulo, onde a efervescência politica e cultural era maior.

Eu e meus queridos amigos e camaradas de luta e vivencia, transitávamos naquela São Paulo desvairada e que ainda garoava em vez de inundar, pelo velho centro. Pelo quadrilátero que ia da Avenida São João, até a Paulista. Da Brigadeiro até a Consolação. Mas também na velha “Boca do Lixo” onde ficavam as produtoras de Cinema “sérios” e pornochanchadas e o velho restaurante “Soberano”.Fora o "Bar Riviera",em frente ao Cine Belas Artes, onde tomavamos umas também, as vezes cercados de agentes da Ditadura disfarçados.

Ali discutíamos o Mundo e filmávamos o que era possível. Carlão Riechenbah, Oszualdo Candeias, Rogerio Sganzerla, Luiz Rozemberg Filho que vivia no Rio, mas sempre ia a Sampa discutir idéias e as vezes buscar financiamento para seus filmes, Walter Hugo Khoury, talvez o mais profissional dos cineastas paulistas, Silvio de Abreu, Jairo Ferreira, Andrea Tonaci, Afonso Brazza(que depois veio para Brasilia fazer filmes e ser Bombeiro. José Mojica Marins, o famoso “Zé do Caixão” . Dos escritorios e “sets” de filmagens íamos pro Soberano almoçar filé a parmegiana e de noite íamos pro “Ponto 4”, “Bar das Putas” na Consolação e até o Gigetto ver os atores famosos da época.

Uisque sem guaraná

Saia eu dos Diários Associados onde era repórter e depois editor já tarde da noite e com o Zézão, José Eduardo Faro Freire, Rubens Gatto, Lia Ribeiro Dias, Maria Luiza Araujo, Beth Lorenzote, João "da Baiana" Teixeira,Clóves Geraldo e outros companheiros íamos articular politica e conversar sobre cultura brasileira no “Pari Bar” da Praça Dom José Gaspar. Depois debandávamos para tomar as ultimas da noite lá pras bandas de Pinheiros, Lapa e Paulista, onde outras turmas se encontravam para tomar umas no fim de noite. A ultima refeição era quase sempre no “Tabu” da boca do lixo, que tinha um filé de primeira e baratinho, a altura de nossos bolsos.

E ainda tínhamos os nossos saraus de poesia e literatura no velho apartamento do Doutor Mozart Menezes, fundador da “Cacimba”, na rua Timbiras, em plena “boca do lixo” onde ia de Celso Lungaretti a Rubens Alvesl ,o poetaço Souza Lopes e sua doce Marcia, Francisco Ugarte e outros viciados em “letras”, politica e boa musica.

Musicas e fim de noite

Ai saimos para ver os músicos da noite que agitavam boates e barzinhos da noite paulistana. João da Baiana Teixeira, Jésus Carlos, o fotografo, o meu querido Alemão-Antonio Eduardo Molina Mandel quando não estava preso. Até o Moa-Moacyr de Oliveira Filho que adorava um samba e outros amigos queridos pintavam sempre na área. Para quem gostava de samba e dançar, tinha o “Som de Cristal, alí pertinho na Rego Freitas e o “Avenida Dançing”, na Rio Branco, quase esquina da São Joao, onde ao lado jogavamos sinuca de vez em quando, depois que os “cobras” do snooker iam descansar.

No bar “Redondo” em frente ao Arena e a Igreja da Consolação encontrávamos TomZé, Gilberto Gil que era executivo de uma multinacional durante o dia e musico de noite, Gracinha Costa, depois Gal, Caetano, Piti e outros baianos que tinham vindo de Salvador para montar o “Arena Canta Bahia”, no Teatro de Arena, hoje Eugenio Kusnet. Desta baianada, só ficou e adotou e foi adotado por São Paulo, TomZé, os outros foram para o Rio de Janeiro e por lá ficaram.

Curtiamos até Benito de Paula que cantava numa boate da Praça Roosevelt. Luiz Carlos Paraná e a boate "Jogral" ao lado do “Terceiro Uisque” na rua Avanhandava, sempre com cantores bons na parada, de Sergio Ricardo, Johnny Alf a Noite Ilustrada! Mas tinha o Chico Buarque que ia no “sujinho” em frente o Sesc e na rua DR. Vila Nova, a turma que não saia do “Redondo”, como Carlão da Vila. Era muita gente!!!

E nós que estudávamos na Filosofia da USP, íamos tomar cerveja no Bar do Zé na esquina da Maria Antonia com Dr. Vila Nova. Dali saiu muitas articulações e recrutamentos de estudantes para a luta armada contra a Ditadura.

E a vida continuava...

E isto depois de durante o dia trabalhar e “cobrir pontos” com os camaradas da luta contra a Ditadura, a turma da ALN, depois da APML e do PCdoB. Discutiamos muito os documentos das organizações e partidos e ainda por cima encontrávamos tempo de participar de ações e de propaganda armada. E sempre tensos, esperando a hora, que sempre chegava para muitos de nós, de ver a chegada dos “home” nas veraneios, com metralhadoras para levar a gente para o DOPS e OBAN e os cárceres sombrios da Ditadura.

Mas a gente saia e continuava na luta e no fervor das idéias e das criações que marcaram a cultura e a história brasileira até hoje.

6 comentários:

Jesus Carlos disse...

Fala meu caro Luiz. Buenos recuerdos, mesmo com todo o chubo da época. Encaminhei para Beth (Lorenzotte), Celso Lungaretti e para o baiano difusor, João Teixeira.
Saludos indígenas,
Jesus.

Elizabeth disse...

Oi Luiz, e pensar que tudo isso foi no século passado. E apesar de tudo, era tão bom. Tinhamos tantos amigos e companheiros ( as).Não vivi nem um terço dessas suas recordações, mas também tive meu quinhão: nós éramos felizes, we few, we happy few, we band of brothers. Abração

Assis disse...

Impossível juntar uma turma com gente desse quilate hoje em dia, turma revolucionária esta que com toque de Midas conseguiu transformar ANOS DE CHUMBO em OURO! Parabéns, sinto-me privilegiado de ser amigo de um dos membros dessa turma e sorver histórias maravilhosas como essa!
Assis

Mazé Leite disse...

Puxa, Luiz, que bom ver essa tua história, de um tempo tão rico! Tenho saudades dos bons tempos em que eu e o Antonio juntávamos gente lá no AP da Vila Madalena pra comer o lagarto recheado com linguiça do Luiz Aparecido! Grande abraço!!!

leonardo ( leo) disse...

Companheiro Luiz!!!!

Parabéns por seu lúcido entendimento e compreensão dos fatos históricos! Aquele período foi importantíssimo para o Brasil de hoje.
leo

José Roberto Leonel Barreto disse...

Querido Luiz Aparecido,procurando o Zezão na Web, encontrei vc tb vc
se lembrará mim, amigo/artista do
Zezão, fui para Europa e EUA e continuei na grande carreira da ARTE...também soube viver e lutar na vida, vivida nos idos 60 aqui em SP, no meu Ap/atelier no Copan,
no Redondo, no Zé, no Riviera, no
Paribar, na Biblioteca e outros.
José Roberto Leonel Barreto-SP.abrs.