sábado, agosto 31, 2013

MÉDICOS CUBANOS: A VELHA CLASSE MÉDIA PIRA!

Médico cubano, negro, vaiado pela pequena burguesia

*Carlos Pompe

No livro  Nova classe média?, o economista Marcio Pochmann mostra que

foram criados 21 milhões de novos postos de trabalho nos últimos dez anos,

sendo 94,8% deste total com salários equivalentes a 1,5 mínimo. Estes

trabalhadores estão sendo chamados de “nova classe média” pelos oligopólios

da comunicação brasileira. Na verdade, não integram a classe média”. Mas a

velha classe média continua atuante no país, e é ela que, servil aos interesses

da classe que lhe é superior, a burguesia, hostiliza os médicos cubanos que

vieram atuar no Brasil e se enoja das políticas sociais que beneficiam a classe

que considera “inferior” a si – a classe proletária, trabalhadora.

 “Seja pelo nível de rendimento, pelo tipo de ocupação, pelo perfil e atributos

pessoais, o grosso da população emergente não se encaixa em critérios sérios

e objetivos que possam ser claramente identificados como classe média”,

escreve Pochmann. Seja pelo nível de rendimento, pelo tipo de ocupação,

pelo perfil e atributos pessoais, o grosso dos médicos e demais pessoas que

participaram dos protestos contra o programa + Médicos e outras ações sociais

do governo e contra a política e os políticos podem ser claramente identificados

com a velha classe média brasileira, a pequena burguesia.

Aquela pequena burguesia que compôs o Integralismo, no início do século

passado; que apoiou a ditadura getulista durante o Estado Novo; que marchou

“com Deus e pela liberdade” (na verdade, pelo golpe militar) em 1964. Essa

pequena burguesia que não se conforma em perder a relação de criadagem

dos trabalhadores domésticos, que herdou das centenas de anos em que a

escravidão imperou no país, agora que eles conquistaram direitos trabalhistas.

Essa gente que acha que os médicos cubanos “tem cara de empregada

doméstica” – talvez achando que sua própria cara pequeno burguesa seja

mais assemelhada à burguesia estampada na revista Caras do que à cara do

trabalhador que vê amontoado no ônibus, no congestionamento, ao passar

com seu carro último tipo (financiado).

No segundo semestre de 1946, numa reunião de sua Organização de Base

no Partido Comunista, o escritor Graciliano Ramos questionou que a pequena

burguesia seja realmente uma classe. “É uma camada vacilante, e diremos

talvez sem contrassenso que o que a caracteriza é a falta de caráter. Subindo

um pouco, tenta insinuar-se no capital – e é favorável à violência, detesta

reuniões, pensa em conformidade com a polícia, teme a foice, o martelo, a cor

vermelha, afeiçoa-se ao golpista e ao delator; largando o emprego, esgotada a

caderneta da caixa econômica, avizinha-se do proletariado – e entra nas filas,

é pingente de bonde, assiste a comícios, descompõe a Light, excede-se em

parolagem demagógica”.

Marx considerava, no  Dezoito Brumário, a pequena burguesia “uma classe

de transição”  (assim, em itálico), na qual os interesses da burguesia e do

proletariado perdem simultaneamente suas arestas. O livro do fundador do

socialismo científico foi escrito quase 100 anos antes do pronunciamento do

escritor brasileiro – como se vê, a classe média é velha de séculos, apesar de

hoje usar a alta tecnologia para difundir seus preconceitos arcaicos e ódio “aos


de baixo”.

*Carlos Pompe é jornalista, militante comunista revolucionario, editor do "Vermelho/DF" e dirigente do PCdoB do Distrito Federal

sexta-feira, agosto 30, 2013

Estou péssimo, mas estou bem!!!

BOLETIM DE DOENÇA!!
Hoje, sexta-feira,29 de agosto, fui consultar meu sempre médico, o melhor neurologista de Brasilia, Dr. Hudson Moura Mesquita. Sai de lá péssimo, mas animado. Não posso ainda dispensar alguns remédios que tomo, pelo contrario, terei que reforçar alguns.  Tenho que fazer exames para ver como anda minha uréia, urina, etc e tal, coisas que não  entendo, mas seguirei à risca.
Falei que minha atrofia anda piorando, meu senso de equilíbrio também, mas ele otimista, acha que nos exames que farei no hospital SARAH semana que vem, pode surgir sugestões de fisioterapia e terapias para melhorar. Mas o meu nervosismo, estress e insônias, etc, isto é da vida, minha mudança de estilo de vida e regimes de abstinências podem ajudar.
Enfim... A coisa não é tão feia assim. Estou péssimo, mas estou ótimo. Há momentos que pioro, outros que melhoro. Acho eu, cá na minha atéia ignorância que só o amor vai resolver isto. Ou piorar de vez.
Tenho muito a cumprir ainda de minha missão de vida e de revolucionário. Vou fazer de tudo para melhorar e seguir em frente. Afinal, na minha crença de que sou highlander, há muito caminho a percorrer, amores a serem vividos e ações revolucionarias a cumprir. È isto!
Mas como diz o poeta/performer,cantor/compositor-ex-Titãs- Arnalldo Antines: “O PULSO AINDA PULSA”

quarta-feira, agosto 28, 2013

Minha doutora Elza Maria!!


Minha filhinha querida e prestimosa, Elza Maria, honrando nome que vem de Monerat e de todas as mulheres combatentes e inteligentes do Mundo, na sua pose mais recente! Agora de óculos e querendo ser doutora como os médicos cubanos que vem ao Brasil para ajudar nosso povo carente. Salve minha querida!  Obrigado Doutor Isnaldo Piedade de Faria, gerador de exemplos e revolucionários, pela força e exemplo!

terça-feira, agosto 27, 2013

O porque das manifestações e levante popular dos últimos meses!!

Por que as metrópoles brasileiras rebelaram-se

Desde a ditadura, elas são o centro da produção de riquezas mas, também, os territórios da desigualdade. Esperança é que, em luta, possam humanizar-se
Por Ermínia Maricato, em Cidades Rebeldes | Imagem: Edith Maffeis Martins
Quem acompanha de perto a realidade das cidades brasileiras não estranhou as manifestações que impactaram o país em meados de junho de 2013.1 Talvez a condição de jovens, predominantemente de classe média, da maioria dos manifestantes exija uma explicação um pouco mais elaborada, já que foi antecedida pelos movimentos fortemente apoiados nas redes sociais. Mas no Brasil é impossível dissociar as principais razões, objetivas e subjetivas desses protestos, da condição das cidades. Essa mesma cidade que é ignorada por uma esquerda que não consegue ver ali a luta de classes e por uma direita que aposta tudo na especulação imobiliária e no assalto ao orçamento público. Para completar, falta apenas lembrar que há uma lógica entre legislação urbana, serviços públicos urbanos (terceirizados ou não), obras de infraestrutura e financiamento das campanhas eleitorais.
As cidades são o principal local onde se dá a reprodução da força de trabalho. Nem toda melhoria das condições de vida é acessível com melhores salários ou com melhor distribuição de renda. Boas condições de vida dependem, frequentemente, de políticas públicas urbanas – transporte, moradia, saneamento, educação, saúde, lazer, iluminação pública, coleta de lixo, segurança. Ou seja, a cidade não fornece apenas o lugar, o suporte ou o chão para essa reprodução social. Suas características e até mesmo a forma como se realizam fazem a diferença.
Mas a cidade também não é apenas reprodução da força de trabalho. Ela é um produto ou, em outras palavras, um grande negócio, especialmente para os capitais que embolsam, com sua produção e exploração, lucros, juros e rendas. Há uma disputa básica, como um pano de fundo, entre aqueles que querem dela melhores condições de vida e aqueles que visam apenas extrair ganhos.
A cidade constitui um grande patrimônio construído histórica e socialmente, mas sua apropriação é desigual e o nome do negócio é renda imobiliária ou localização, pois ela tem um preço devido a seus atributos. Isso tem a ver também com a disputa pelos fundos públicos e sua distribuição (localização) no espaço.2
Como integrantes de um país da periferia do capitalismo, em que pesem as novas nomenclaturas definidas pelo mainstream, as cidades brasileiras carregam uma herança pesada. A desigualdade social, uma das maiores da América Latina, e a escravidão vigente até pouco mais de um século atrás são características que se somam a um Estado patrimonialista e à universalização da “política do favor”. De que forma essas características aparecem nas cidades? Como não é o caso de fazermos uma leitura extensa, pois este texto é apenas um ponto de partida, vamos priorizar o fato de que grande parte de nossas cidades é construída pelos próprios moradores em áreas invadidas – muitas delas ambientalmente frágeis – ou adquiridas de loteadores ilegais. Para a construção desses bairros não contribuem arquitetos ou engenheiros, tampouco há observância de legislação urbanística ou de quaisquer outras leis, até mesmo para a resolução dos (frequentes) conflitos, para a qual não contribuem advogados, cortes, juízes ou tribunais. Trata-se de uma força de trabalho que não cabe no mercado residencial privado legal, que por sua vez (e por isso mesmo) é altamente especulativo. Trata-se, portanto, de uma força de trabalho barata, segregada e excluída da cidade legal. Assim como vivemos a industrialização dos baixos salários, podemos dizer que vivemos a urbanização dos baixos salários. A melhoria desses bairros é fonte inesgotável do velho clientelismo político: trocam-se por votos a pavimentação de uma rua, a iluminação pública, uma unidade de saúde, uma linha de ônibus etc.
A cidade formal, destinada a ser simulacro de algumas imagens-retalhos do “Primeiro Mundo”, é a outra face da moeda. Uma não existe sem a outra. Os exemplos virão quando tratarmos do momento atual.
Foi sobre essa base extremamente desigual que se deu, no início dos anos 1980, o ajuste fiscal. O Brasil vinha há quarenta anos num crescimento acima dos 7% ao ano. As migalhas desse banquete traziam algum conforto para a população migrante, que chegava aos milhares nas cidades, em especial nas principais metrópoles. Com a globalização e o ajuste fiscal, a tragédia urbana se aprofundou.
A contar a partir dos anos 1980, o impacto das décadas seguintes de baixo crescimento, alto desemprego e recuo das políticas públicas e sociais determinadas pelo receituário neoliberal pode ser medido por muitos indicadores, mas vamos fazê-lo aqui pelo aumento da violência urbana. A taxa de homicídios cresceu 259% no Brasil entre 1980 e 2010. A principal vítima dos homicídios é o jovem negro e pobre, morador da periferia metropolitana.3
Com a globalização, o território brasileiro passa por notável transformação. Mudam as dinâmicas demográfica, urbana e ambiental, além das social e econômica. A exportação de commodities – grãos, carnes, celulose, etanol, minérios – ganha o centro da política econômica e sua produção reorienta os processos demográficos. A urbanização se interioriza. O tsunami dos capitais globais e nacionais passou antes pelo campo, subordinando o que encontrou pela frente: terras indígenas ou de quilombolas, florestas amplamente derrubadas, o MST, criminalizado, e lideranças, inclusive religiosas, assassinadas.
Contraditoriamente, foi nesse período que floresceu uma nova política urbana, em torno da qual se organizaram movimentos sociais, pesquisadores, arquitetos, urbanistas, advogados, engenheiros, assistentes sociais, parlamentares, prefeitos, ONGs etc. Construiu-se a Plataforma de Reforma Urbana, e muitas prefeituras de “novo tipo” (ou democrático-populares) adotaram novas práticas urbanas. Além de incluir a participação social – orçamento participativo, por exemplo –, priorizou-se a urbanização da cidade ilegal ou informal, que era invisível até então para o urbanismo e as administrações públicas. Esse movimento logrou criar um novo quadro jurídico e institucional ligado às cidades – política fundiária, habitação, saneamento, mobilidade, resíduos sólidos –, além de novas instituições, como o Ministério das Cidades (2003), o Conselho das Cidades (2004) e as conferências nacionais das Cidades (2003, 2005 e 2007). O Estatuto da Cidade, festejado no mundo todo como exemplar, foi aprovado no Congresso após treze anos de luta popular, em 2001.
Por mais paradoxal que possa parecer, apesar de todo esse avanço institucional, quando o governo Lula retomou em 2009 os investimentos em habitação e saneamento numa escala significativa, após quase trinta anos de estagnação nesse sentido, as cidades se orientaram em uma direção desastrosa.
As primeiras medidas de combate à fome e à pobreza constituíram um círculo virtuoso de fortalecimento do mercado interno. Os principais programas sociais do governo Lula, continuados pelo de Dilma Rousseff, foram o Bolsa Família, o Crédito Consignado, o Programa Universidade para Todos (ProUni), o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa Luz para Todos. Garantiu-se também um aumento real do salário mínimo (de cerca de 55%, entre 2003 e 2011, conforme o Dieese). Os classificados em “condição de pobreza” diminuíram sua representação de 37,2% para 7,2% nesse mesmo período. Além disso, o crescimento tanto da economia quanto das taxas de emprego trouxe esperança de dias melhores.4
Em 2007, o governo federal lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), voltado para o investimento em obras de infraestrutura econômica e social. O modelo visava à desoneração fiscal de produtos industriais e buscava alavancar o emprego na indústria da construção. Após a crise de 2008, essa orientação foi aprofundada. Em 2009, foram lançados o PAC II e o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, desenhado por empresários da construção e do mercado imobiliário em parceria com o governo federal. Teve então início um boom imobiliário de enormes proporções nas grandes cidades. Enquanto em 2009 o PIB brasileiro e da construção civil foram negativos, contrariando a tendência anterior, em 2010 o crescimento nacional foi de 7,5% e o da construção civil, de 11,7%.5 Em seis regiões metropolitanas, o desemprego, que atingia 12,8% em 2003, caiu para 5,8% em 2012. A taxa de desemprego da construção civil no período diminuiu de 9,8% para 2,7%.6 O investimento de capitais privados no mercado residencial cresceu 45 vezes, passando de R$ 1,8 bilhão em 2002 para R$ 79,9 bilhões em 2011,7 e os subsídios governamentais (em escala inédita no país) cresceram de R$ 784.727 para mais de R$ 5,3 bilhões em 2011.8
O coração da agenda da reforma urbana, a reforma fundiária/imobiliária, foi esquecido. Os movimentos sociais ligados à causa se acomodaram no espaço institucional em que muitas das lideranças foram alocadas. Sem tradição de controle sobre o uso do solo, as prefeituras viram a multiplicação de torres e veículos privados como progresso e desenvolvimento. Certa classe média viu suas possibilidades de galgar à casa própria aumentarem, especialmente graças às medidas de financiamento estendido e à institucionalização do seguro incluídas no Minha Casa, Minha Vida.
Com exceção da oferta de emprego na indústria da construção, para a maioria sobrou o pior dos mundos. Em São Paulo, o preço dos imóveis aumentou 153% entre 2009 e 2012. No Rio de Janeiro, o aumento foi de 184%. A terra urbana permaneceu refém dos interesses do capital imobiliário e, para tanto, as leis foram flexibilizadas ou modificadas, diante de urbanistas perplexos.9 A disputa por terras entre o capital imobiliário e a força de trabalho na semiperiferia levou a fronteira da expansão urbana para ainda mais longe: os pobres foram para a periferia da periferia.10 Novas áreas de proteção ambiental acabam sendo invadidas pelos sem alternativas, pois a política habitacional está longe do núcleo central do déficit.11 Os despejos violentos foram retomados, mesmo contra qualquer leitura da nova legislação conquistada por um Judiciário extremamente conservador.12Favelas bem localizadas na malha urbana sofrem incêndios, sobre os quais pesam suspeitas alimentadas por evidências constrangedoras.13
Os megaeventos – como a Copa e as Olimpíadas – acrescentam ainda mais lenha nessa fogueira. Os capitais se assanham na pilhagem dos fundos públicos, deixando inúmeros elefantes brancos para trás. Mas é com a condição dos transportes que as cidades acabam cobrando a maior dose de sacrifícios por parte de seus moradores. E embora a piora de mobilidade seja geral – isto é, atinge a todos –, é das camadas de rendas mais baixas que ela vai cobrar o maior preço.
O tempo médio das viagens em São Paulo era de 2 horas e 42 minutos em 2007. Para um terço da população, esse tempo é de mais de três horas.14
A desoneração dos automóveis somada à ruína do transporte coletivo fizeram dobrar o número de carros nas cidades. Em 2001, havia em doze metrópoles brasileiras 11,5 milhões de automóveis e 4,5 milhões de motos; em 2011, 20,5 milhões e 18,3 milhões, respectivamente. Os congestionamentos em São Paulo, onde circulam diariamente 5,2 milhões de automóveis, chegam a atingir 295 quilômetros das vias.
O governo brasileiro deixou de recolher impostos no valor de R$ 26 bilhões desde o final de 2008 (nesse mesmo período, foram criados 27.753 empregos), e US$ 14 bilhões (quase o mesmo montante dos subsídios) foram enviados ao exterior. Há mais subsídios para a circulação de automóveis (incluindo combustível e outros itens) do que para o transporte coletivo.15
A prioridade ao transporte individual é complementada pelas obras de infraestrutura dedicadas à circulação de automóveis. Verdadeiros assaltos aos cofres públicos, os investimentos em viadutos, pontes e túneis, além de ampliação de avenidas, não guardam qualquer ligação com a racionalidade da mobilidade urbana, mas sim com a expansão do mercado imobiliário, além, obviamente, do financiamento de campanhas.
O forte impacto da poluição do ar na saúde da população de São Paulo, com consequente diminuição da expectativa de vida, tem sido estudado pelo médico Paulo Saldiva, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Saúde e Sustentabilidade. O comprometimento da saúde mental (depressão, ansiedade mórbida, comportamento compulsivo) tem sido estudado pela psiquiatra Laura Helena Andrade, também pesquisadora da USP. É da vida, do tempo perdido, mas também da morte, literalmente, que estamos tratando.
Concluindo: para fazer frente a esse quadro, aqui apenas resumido, temos no Brasil leis, planos, conhecimento técnico, experiência, propostas maduras e testadas nas áreas de transporte, saneamento, drenagem, resíduos sólidos, habitação… Mas, além disso, o primeiro item necessário à política urbana hoje é a reforma política, em especial o financiamento de campanhas eleitorais. Então, que viva a moçada que ganhou as ruas. Se fizermos um bom trabalho pedagógico, teremos uma nova geração com uma nova energia para lutar contra a barbárie.

Ermínia Maricato é professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e professora visitante da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Formulou a proposta do Ministério das Cidades, no qual foi ministra adjunta (2003-2005). Este artigo faz parte do livro Cidades rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil.
1 Ver, da autora, artigos anteriores que tratam do assunto em: .
2 Essas ideias, aqui toscamente rascunhadas, estão baseadas em bibliografia de autores que se ocuparam da leitura marxiana da questão urbana: Henri Lefebvre, David Harvey, Christian Topalov, Jean Lojkine, Alain Lipietz, Manuel Castells, Sergio Ferro e Nilton Vargas (esses dois últimos no Brasil), entre outros.
3 Cf. Julio Jacobo Waiselfisz, “2012 | A cor dos homicídios no Brasil”, Mapa da Violência. Disponível em: .
4 Marcio Pochmann, Nova classe média? Trabalho na pirâmide social brasileira, São Paulo, Boitempo, 2012.
5 Cf. a página da internet da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Disponível em: .
6 Idem.
7 Cf. as páginas na internet da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) e do Banco Central do Brasil. Disponíveis, respectivamente, em: e .
8 Cf. Teotônio Costa Rezende, “O papel do financiamento imobiliário no desenvolvimento sustentável do mercado imobiliário brasileiro”, palestra apresentada no Sindicato da Habitação (Secovi), São Paulo, 1º dez. 2012.
9 Ver Ana Fernandes, “Salvador, uma cidade perplexa”, Carta Maior, 21 set. 2012. Disponível em: ; e Jurema Rugani, “Participação social, a Copa, a cidade: como ficamos?”, Carta Maior, 24 ago. 2012. Disponível em: .
10 Ver Leticia Sigolo, “Sentidos do desenvolvimento urbano: Estado e mercado no boom imobiliário do ABCD” (título provisório), doutorado em andamento, FAU-USP.
11 Ver Luciana Ferrara, “Autoconstrução das redes de infraestrutura nos mananciais: transformação da natureza na luta pela cidade”, tese de doutorado, FAU-USP, 2013.
12 A respeito das remoções forçadas, ver o material de pesquisa coletado pelo grupo Observatório de Remoções, da FAU-USP. Disponível em: . Ver ainda o blog da urbanista e professora de arquitetura Raquel Rolnik: .
13 Sobre incêndios em favelas, ver João F. Finazzi, “Não acredite em combustão espontânea”, Carta Maior, 11 set. 2012. Disponível em: .
14 Cf. Companhia do Metropolitano de São Paulo – Metrô, Pesquisa origem e destino 2007. Disponível em: .
15 Ver Marcos Pimentel Bicalho, “O pesadelo da imobilidade urbana: até quando?”, Carta Maior, 4 jul. 2012.

quarta-feira, agosto 21, 2013

MATERIA TOCANTE E ABRANGENTE. CÉSARES STÃO EM VOLTA DE NÓS!!!!

Somos todos César

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Crônica sobre garoto mexicano, em meio à rebelião dos estudantes, inaugura nova coluna de “Outras Palavras”: agora sobre aqueles que não vemos
Texto e foto: Laís Modelli
Outras Palavras inaugura uma nova coluna: “Outras Pessoas/Outras Vidas”. Publicada semanalmente, trará textos dos jornalístas Laís Modelli e Rôney Rodrigues. Serão perfis de pessoas anônimas, marginalizadas, esquecidas. Rostos que sofrem os problemas sociais e que fazem parte das piores estatísticas publicadas nos jornais diários. Pessoas que têm perguntas – e respostas – embora nunca sejam perguntadas; que têm desejo e sonhos, que talvez nunca se realizem. Pessoas que existem, mas não enxergamos.
México. Está ali, ao lado do país mais influente do mundo. Tem uma das fronteiras mais problemáticas do cenário global, nos últimos cem anos. Mas quem são os seus? Qual o nome do atual presidente do país? Ignoramos a informação, não sabemos responder. Mas deveríamos – por questões de geografia, ética e direitos humanos.
Pois Enrique Peña Neto, atual presidente do México, é membro de uma agremiação política – o PRI, Partido Revolucionário Institucional – que governou o país por setenta anos seguidos, no século passado, e em 2013 voltou à Presidência. Enrique foi acusado, durante sua campanha eleitoral, de matar a própria mulher (ela era dependente química, em um país que tem como maior problema social o narcotráfico). Também é acusado de casar logo em seguida com uma atriz famosa e popular, que teria escolhido e encomendado em uma revista tipo “Caras”. Ainda estão nas contas de Peña e do PRI a acusação de ter produzido fraude nas eleições presidenciais, no ano passado. É aqui que começa nossa história: na fraude.
Setembro de 2012
Monumento da Revolução, Cidade do México. Avisto dezenas de barracas armadas embaixo do ponto turístico construído em homenagem a Emiliano Zapata e à Revolução Mexicana. Caminho a passos largos até elas, mas não me deixam entrar no acampamento. Jovens desconfiados me tomam pelo braço, me pegam a câmera e me fazem apagar a foto que descuidadosamente tirei de uma criança que corria entre as barracas.
Perguntam quem sou eu e o que quero ali. Eu não sei responder nem a primeira, nem a segunda pergunta. Pouco tempo depois, descubro que eles se chamam de #YoSoy132, um dos maiores movimentos sociais da atualidade do México. Nasceram contra a fraude eleitoral e a reeleição do partido de Enrique Peña Neto. Começou com estudantes e professores universitários, em julho de 2012, até que se popularizou e passou a atrair pessoas de outros segmentos da sociedade, como estrangeiros, ilegais, desempregados e o César.
César
8 anos. Não tem pai. Mãe desempregada. Ascendência indígena. Antes mesmo de falar o espanhol, já falava o dialeto de seus antepassados, porque esse aprendeu em casa, não precisou ir para escola. É baixinho, de olhos puxados, mirrado como a sua condição social.
Mas César tem o dom para os discursos esquerdistas a la Maiakovsky. Esse ímpeto discursivo o fazia tomar o microfone em todas as manifestações e assembleias. Aí era gigante. Enchia os pulmões de ar e berrava para a multidão. “México: alerta!”, “Coca-cola: asco! Enrique Peña Neto: asco!” Oito anos. Eu não tinha essa consciência aos dezoito. César ainda não sabe escrever um mundo de palavras em espanhol, mas já sabe o que significa asco político. César não tem mais casa, mora com a mãe no acampamento do #YoSoy132. César não frequenta a escola porque não conseguiu vaga. É normal isso no México, sempre ficam crianças de fora um ano ou outro. Naquele ano, foi a vez do César. O jeito era virar morador de barracas aos pés de Zapata. Para compensar a falta da sala de aula, os manifestantes do movimento se revezavam em aulas de gramática, matemática e até de artes cênicas para o menino mirrado. César se tornara o coração do acampamento.
Janeiro de 2013. Vem a verdade sobre César: a mãe do menino era uma espécie de espiã do partido de Peña Neto que se infiltrou no acampamento. Em troca de cestas básicas, ela deveria fornecer informações e nomes de organizadores do movimento.
Todos sentiram o nó na garganta quando descobriram o que levara César ao acampamento do #YoSoy132 – desde o mais revolucionário ao mais “maria-vai-com-as-outras”. O garoto ainda era novo pra compreender, mas o seu asco dito nos microfones da revolução vinha de quem comprava sua mãe, desempregada, alienada pelo Estado e largada pelo marido. César, por não ter o que comer, também não podia mais ter em que acreditar. Beija essa boca que te escarra, César. Afaga essa mão vil que te apedreja. É a mais perfeita vida que Augusto dos Anjos anunciava tempos atrás.
Esses são tempos de Césars. De milhões deles por ai, morando embaixo de monumentos de Zapata, embaixo do Minhocão, esquecidos no vão do Masp e largados embaixo das pontes, à mercê da sociedade. Somos todos pais de César, calados pela fome do básico. Somos todos Césars.

segunda-feira, agosto 19, 2013

Luiz Manfredini nos ajuda a refletir que partido estamos construindo!!!

É o Partido, camaradas!

Um tema crucial que nunca abandonou as reflexões partidárias, mas que de uns tempos para cá, sobretudo no presente processo do 13° Congresso, vem se impondo com ênfase, dizem respeito à natureza, missão e princípios ideológicos, políticos e organizativos norteadores do partido comunista.
Por Luiz Manfredini *

O tema é crucial porque a existência do partido comunista é decisiva para impulsionar a luta socialista, em produtiva, sinérgica interação com as demais forças de esquerda que também reivindicam o socialismo. A essencialidade desse tipo de partido decorre de sua responsabilidade histórica de perseguir a construção do sujeito político – isto é, a massa consciente de trabalhadores e seus aliados – capaz de levar adiante a transformação radical da sociedade, com vistas à substituição do capitalismo pelo socialismo.
No artigo “Partido das grandes causas do povo brasileiro e da humanidade”, veiculado pelo Vermelho por ocasião do 91o aniversário do PCdoB, o camarada José Reinaldo Carvalho sintetizou com propriedade: “A outra pedra de toque do pensamento e da ação do PCdoB é o esforço persistente para construir um partido comunista organicamente forte, ideológica e politicamente capaz, à altura da sua missão histórica, ligado às massas, em especial aos trabalhadores, um Partido com força militante, influência política ampla, presente nos acontecimentos candentes, dotado de amplo horizonte histórico, cultural e teórico, enraizado no solo nacional, patriótico e internacionalista”.
A trajetória de um partido comunista deve ser considerada sempre em perspectiva, no cenário dinâmico de seus objetivos estratégicos e não apenas diante das emergências da tática. E, outras palavras, o que verdadeiramente interessa e serve à causa revolucionária, no âmbito dos debates do 13o Congresso, é verificar se o partido que estamos construindo hoje, de acordo com as circunstâncias históricas do momento e todas as suas possibilidades e limitações, fortalece ou não a acumulação estratégica de forças. Em outras palavras, a tática deve ser vista no arco de um horizonte estratégico. O contrário nos conduzirá a um taticismo esvoaçante e inconsequente.
A construção de um partido nos moldes propostos, com essa visão estratégica, não é tarefa para quando estivermos nas portas do socialismo, mas para já. Caso contrário, as portas do socialismo estarão fechadas para nós.
Obviamente a ideia de um partido de massas e de quadros está aberta às indicações contemporâneas da luta política e social. Aqui não se defende um partido cristalizado, impermeável ao que de novo o desenvolvimento histórico nos vai apresentando. Não seríamos, se o fizéssemos, os dialéticos que pretendemos ser. Mas atualização alguma poderá negar questões essenciais como o fundamento teórico e o caráter de classe do partido, sua identidade comunista, sua concepção organizativa, seus compromissos estratégicos, pois daí não seria atualização, mas capitulação.
As teses congressuais reconhecem que o Partido, no período examinado, viveu “novas oportunidades, desafios e riscos”. Numa trajetória considerada fundamentalmente positiva, surgiram pressões próprias da época, voltadas para “o rebaixamento do papel estratégico do Partido”. Alinham, as teses, os riscos mais perniciosos a evitar, entre os quais o liberalismo, o corporativismo, o dogmatismo, o carreirismo e o personalismo. Não é de subestimá-los, até porque não me parecem, tais desvios, apenas riscos (no sentido de probabilidade de existir). Já estão presentes – por vezes furtivamente – em diversas circunstâncias. Revelam-se, por exemplo, num certo discurso que propõe, ainda que de modo subliminar, a adoção de um “pragmatismo controlado” com vistas a resultados eleitorais mais favoráveis, ou o que prega um “partido sem porteiras”, conduzindo-o, segundo temo, a um perigoso estado de obesidade mórbida. A gana eleitoral que se percebe acaba por facultar as fileiras partidárias, indiscriminadamente, a quem oferecer maior punhado de votos, mesmo que, com isso, o Partido venha a se tornar mero trampolim para carreiras nada recomendáveis. A esse impulso pela formação, a qualquer custo, de bancadas parlamentares, vê-se, em algumas situações, forte apetite por cargos governamentais, muitas vezes sem conexão com a tática partidária. São alguns exemplos de como o viés eleitoral termina, nesses casos, por embaçar os dois outros (e insubstituíveis) pés da ação partidária, ou seja, a luta de massas e a luta de ideias.
Não é por menos que as teses dedicam todo um trecho (“Perspectivas atualizadas para a edificação partidária”) para advertir contra tais tendências negativas. Não identificadas e não combatidas adequadamente, contribuem – até decisivamente – para nublar o rumo estratégico do Partido. E, na medida em que turvam esse rumo, não ajudam na acumulação de forças em direção a ele. Ou seja, corre-se o risco de adotar – ainda que involuntariamente - o conceito fundante do revisionismo moderno: “o movimento é tudo, o objetivo final, nada”.
Frente a isso as teses orientam “tratar de maneira combinada três formas de luta entrelaçadas para acumular forças em caráter estratégico, portanto revolucionário, sem unilateralismos: a luta social de massas, a luta política-eleitoral e a luta de ideias, todas elas com caráter político. Junto a isso, disputar ativamente as bases sociais fundamentais, a saber, os trabalhadores, a juventude e as mulheres. E seguir aprimorando o centralismo democrático, para um partido com liberdade de opinião e unido na ação concreta em cada caso”. O que indicam as teses, no entanto, deve se tornar realidade mais efetiva e abrangente.
Refletir criticamente sobre essas e outras questões importantes para a luta socialista no Brasil, fortalecendo o protagonismo revolucionário do PCdoB, é o sentido maior dos debates do 13o congresso. Afinal, o grande encontro dos comunistas não deve se restringir às loas e exaltações de praxe. O marxismo e o movimento comunista, desde os seus primórdios, se desenvolveram a base de intensas reflexões e debates e quase sempre em polêmica com ideias contrárias. Foi esse exercício dialético que o robusteceu. E será sob o influxo de um pensamento vivo, crítico, que o PCdoB fortalecerá seu protagonismo essencial frente aos desafios contemporâneos da revolução brasileira.

* Luiz Manfredini é jornalista e escritor, militante do PCdoB no Paraná.


domingo, agosto 18, 2013

Os comunistas comunicadores do Distrito Federal




Exitosa e alvissareira(como dizia nosso inesquecível e saudoso líder João Amazonas) da Base de Comunicadores do PCdoB no Distrito Federal. Na primeira foto tem quase todos os participantes, pois alguns já tinham saído para outros  compromissos, depois eu, Augusto Madeira, nosso presidente regional e Carlos Pompe, secretario de Comunicação do Partido aqui e ainda eu e Rogerio Siqueira outro importante membro desta base comunista. Onde aliás todos são de  somemos importância!! E cheio de mulheres bonitas, o que transforma a base num centro de irradiação revolucionaria inconteste!! Tudo isto e muito mais aconteceu na Ascade, de  Brasilia, no sábado dia 17de agosto de 2013. 

sexta-feira, agosto 16, 2013

Guerrilheiros Zapatistas, no México criam sua própria escola nas áreas dominadas!!!

POR 

Professora da Escuelita zapatista. [Foto: Moysés Zúñiga Santiago]
Crônica da Chiapas — onde EZLN abre, para 1700 “alunos” de todo planeta, primeira vivência em práticas de liberdade e autonomia
Por Marta Molina, de Chiapas | Tradução: Bruna Bernacchio
Depois de três dias de festa nos cinco Caracóis zapatistas pelo 10º aniversário das Juntas de Bom Governo (JBG) já está tudo pronto para a tão esperada Escuelita da Liberdade, que começou dia12 de agosto simultaneamente em La Realidad, Oventic, Morelia, La Garrucha, Roberto Barrios, assim como no Centro Indígena de Capacitação Integral (Cideci) em San Cristóbal de Las Casas”.
Mais de 1700 alunos vieram do mundo todo para participar da primeira turma desta escola autônoma zapatista, entre os dias 12 e 16 de agosto. Ninguém sabe exatamente como vai ser, mas sabem  que vão aprender a escutar o que os povos originários de Chiapas têm a dizer. Vão conviver com eles e participar de seu cotidiano.
Desde cedo, na manhã do 10 de agosto começaram a chegar ao Cideci alguns dos convidados à Escuelita. Todos deviam chegar a esse espaço para saber o lugar onde terão as aulas durantes os próximos cinco dias. Alguns decidiram ir ao Caracol correspondente a pé mesmo e cederam, aos que chegariam mais tarde, espaço nos ônibus de traslado.
No dia 11, apareceram rios de gente com suas mochilas pesadas, caminhando pela trilha de chão batido que chega ao Cideci para confirmar sua inscrição. Deviam ter seu número de confirmação de registro e uma identificação em mãos. Vários grupos de apoio ajudaram a agilizar as inscrições e a organizar os alunos em filas segundo o Caracol a que iriam viajar.
Antes das 11 da manhã, duas caminhonetes com o letreiro “Maestr@s da Escolinha Zapatista” chegaram, com parte do comando do Exército Zapatista de Liberação Naciona (EZLN) a bordo – Tacho, David, Felipe, Zebedeo, Bulmaro, Ismael, Miriam, Susana, Hortensia e Yolando, entre outros. Coordenaram a saída dos mais de 45 veículos entre caminhonetes com caçambas, kombis – todas identificadas com o município autônomo zapatista ao qual pertencem – e um School Bus amarelo estacionados na entrada do Cideci, ali onde começa o caminho velho a San Juan Chamula.
A maioria dos alunos chega sem uma expectativa concreta, “para ver o que encontram o como será”; mas vêm, sim, dispostos a escutar, aprender e trabalhar muito. Se respira emoção e impaciência entre os que estão já estão para sair. Muitos deles nunca estiveram em uma comunidade indígena ou em um Caracol zapatista, como Federico Gómez do movimento “Más de 131” que começou a se aproximar do zapatismo faz aproximadamente um ano. De seu coletivo, chegaram mais 20 pessoas à Escuelita.
Krisna é trabalhador sexual transgênero e vem da Cidade do México. Comenta que lhe interessa conhecer as funções de homens e mulheres na luta zapatista. “Venho aprender mais. Nada melhor que os companheiros, que nos presentearem seu tempo para ensinar. Vai ser tudo horizontal, com muito respeito e dignidade, e vamos esperar que eles nos compartilhem seus processos de autonomia”.
Entre os alunos, além de mexicanos e mexicanas de quase todos os estados, há gente de todas as partes do mundo, mas sobretudo da Europa e Américas — do Sul, Central, do Norte. Gente que não está articulada com nenhum coletivo, coletivos que acabam de nascer e estão em pleno processo de formação, grupos e movimentos aderentes à “Sexta Declaração da Selva Lacandona” e intelectuais que acompanham a luta zapatista desde seus inícios. Entre esses rostos conhecidos, chegaram Jean Robert, Gustavo Esteva e Pablo González Casanova que figuram, junto com outros, entre “os convidados especiais que estarão isentos de qualificações” porque, como expressou o Subcomandante Marcos em um de seus últimos comunicados. “Entendem bem o que é a liberdade segundo os zapatistas”, mas devem estar presentes neste momento tão importante que caminha “até um só destino, que também é delas e deles”.
Também chegaram às terras sagradas da alegre rebeldia músicos que apoiam o zapatismo desde sempre como o Mastuerzo e Rocko Pachukote. Participaram do espetáculo inaugural da Escuelita que começou às 9h da manhã e terminou às 9h da noite e foi transmitido ao vivo na internet pelo coletivo Koman Ilel.
“Onde podemos encontrar uma escolinha que dê gratuitamente transporte, hospedagem, alimentação, livros de texto, materiais e onde, ao mesmo tempo, haja um professor por cada aluno, 24h por dia contigo durante o curso?”, comenta Rocko em entrevista com aRede de Mídias Livres de Chiapas em uma das cabanas de sapé do Cideci. Segundo ele, a essência da escola é ensinar e aprender como ser seres humanos melhores. Vê tudo isso como uma sábia iniciativa que vem de Votán Zapata nesses momentos em que, em todo os mundos, os movimentos estudantis são parte fundamental da transformação das sociedades. No Chile, México, em toda a América Latina, os estudantes estão questionando o que é educação e que educação estão dando a eles. “Nos educam para trabalhar em suas transnacionais para seus projetos destruidores ou a educação pode ser para sermos melhores seres humanos?”, pergunta-se o roqueiro e ativista mexicano que, apesar de ser convidado a essa primeiro edição da escolinha, assistirá à segunda edição.
Às três da tarde, depois de horas debaixo de um intenso sol, começaram a desfilar as primeiras caminhonetes e kombis em direção a La Realidad, município da Las Margaritas, um dos Caracóis mais afastados de San Cristóbal de Las Casas. Na fila, encontramos Luiz Antônio Guerra que veio de Goiás, Brasil, e participa do Movimento Passe Livre: “venho aprender sobre liberdade e sabedoria dos companheiros zapatistas”.
“Vão a La Realidad? Podem deixar aqui as mochilas. Carreguem só o que vão beber no caminho”, comenta do comandante Davi com um rádio nas mãos. “Mochilas aqui, alunos ali”, indica uma comandante que organiza sem parar, junto com Tacho e Davi, para que a saída seja fluida e organizada.
O resto dos alunos e alunas espera a partida paciente, sentados no jardim do Cideci, enquanto tocam violão e cantam canções alegres. Começa a convivência do que talvez, nos próximos dias, plante a semente de uma possível rede de redes de movimentos, tão necessária no contexto do México e do mundo atual — rasgado de dor e esquecimento, mas cheio de esperança com novos movimentos estudantis, de meios independentes, em defesa do território e de outras resistências rurais e urbanas que entendem a construção de autonomia como um caminho para construir um mundo onde cabem muitos mundos possíveis.
Enquanto isso, os fotógrafos da mídia comercial, aos quais não foi permitido tirar fotos durante as festas do 10º aniversário nos Caracóis, pulavam contentes, compensando seu desejo de captar imagens dos companheiros e companheiras zapatistas encapuzados. Tentavam identificar os e as comandantes debaixo de seus gorros pretos. Faziam perguntas que nunca seriam respondidas e que só os desviavam da tarefa que lhes foi encomendada: organizar a saída da Escuelita.
Recordamos com um grupo de cinco alunos, que esperam sua vez para sair, as palavras do subcomandante Moisés, no comunicado do 17 de março de 2013, que anunciou os primeiros detalhes da Escuelita zapatista:

Você compareceria a uma “Escuelita”  onde as professsoras e professores são indígenas, cuja língua materna está rotulada como “dialeto”?
Conteria a vontade de estudá-l@s como objeto de antropologia, da psicologia, do direito, do esoterismo, da historiagrafia, de fazer uma reportagem, de lhes fazer uma entrevista, de dizer-lhes sua opinião, de dar-lhes conselhos e ordens?
Poderia vê-l@s, ou seja, escutá-l@s?
Ao menos esses dez alunos estão dispostos a escutar, aprender e viver a experiência sem a necessidade de tirar fotos nem fazer entrevistas. Perguntaremos a eles em cinco dias, quando regressarem da primeira turma da Escuelita, que já tem várias outras programadas, devido à alta procura. A próxima, entre 3 e 7 de janeiro de 2014, logo depois da celebração dos vinte anos do levantamento zapatista.
A las 9 de la noche salían los últimos grupos de estudiantes rumbo a su Caracol con sus cuadernos de texto de primer grado del curso “La libertad según los Zapatistas” y dos discos compactos. Pero para esta primera edición, también habrá videoescuelita con retransmisiones en directo a las 14h y a las 21h para quienes se hayan registrado a través del e-mail video@ezln.org.mx. En varios lugares del mundo colectivos que no pudieron llegar físicamente a México ya están organizando su Escuelita virtual que empieza hoy a las 2 de la tarde.
Às 9 da noite saíam os últimos grupos de estudantes rumo a seu Caracol, com seus cadernos de texto de primeiro ano do curso “A liberdade segundo os Zapatistas” e dois discos. Mas para essa primeira edição, também haverá videoescola com transmissões ao vivo das 14h às 21h, para quem se registrou através do e-mail video@ezln.org.mx. Em vários lugares do mundo coletivos que não puderam chegar fisicamente ao México já estão organizando sua Escuelita virtual que começou ontem às 2h da tarde.
Marta Molina
Marta Molina é jornalista independente, de Barcelona, Cataluña. Escreveu para vários veículos independentes em diversos países, sobre resistências culturais no Brasil, lutas não-violentas na Palestina e agora vive no México, seguindo os passos do Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade (MPJD) contra a guerra às drogas e movimentos em defesa da terra, e que lutam pela autonomia, no Sul do México e na Guatemala. Pode segui-la através de seu blog Reporting on Resistances ou no Twitter @martamoli_RR.


quarta-feira, agosto 14, 2013

Da "Tribuna de Debates do Congresso do PCdoB para o Blog do Luiz Aparecido

Rita Coitinho: Sobre o Leninismo Contemporâneo

Em uma fala dirigida contra Trostky, Lênin disse certa vez que a insistência de alguns intelectuais em inventar categorias servia unicamente para confundir o povo e tergiversar sobre os princípios, levando a discussões inúteis, enormes perdas de tempo e até mesmo a cisões no seio do partido.
São momentos históricos bastante diferentes, mas nas teses do 13o congresso do PCdoB é inevitável que nos surja uma interrogação sobre uma nova categoria que aparece no parágrafo 105: o "leninismo contemporâneo". Ele parece estar ligado à outra formulação, a de "um partido de feições modernas". É de fato necessário lançar mão dessas novas categorias?

Nosso primeiro exercício é o de refletir sobre o leninismo ou, para usar o termo exato, o marxismo-leninismo, para a seguir entender as razões por que se busca substituir um conceito por outro. Em artigo que publiquei há alguns meses citei uma passagem de Álvaro Cunhal em que ele definiu de maneira clara e profunda a essência do marxismo-leninismo: "um sistema de teorias que explicam o mundo e indicam como transformá-lo". Seus princípios e o método são instrumentos indispensáveis à análise científica da realidade e à definição de soluções concretas para os problemas concretos que a situação objetiva e a luta colocam às forças revolucionárias. Constituem-se em patrimônio teórico e enriquecem-se com a assimilação crítica das experiências históricas.

O partido aprendeu com seus próprios reveses que o dogmatismo - a substituição da análise das situações e dos fenômenos pela transcrição sistemática dos textos clássicos como respostas a situações que só a análise atual pode permitir – precisa ser combatido, sob pena de levar o partido a ações desconectadas da realidade e ao isolamento. E o entendimento da teoria marxista-leninista como instrumento de análise é a negação do dogmatismo. É a permanente confrontação da realidade com a teoria e o desenvolvimento criativo do pensamento em interação com a prática.

Na luta contra o dogmatismo o partido tem buscado com seriedade o estudo da realidade brasileira, trazendo novos intelectuais para o partido, incentivando a produção de estudos sobre as mais diversas áreas. Por outro lado a grande influência da academia nas formulações partidárias vem trazendo algumas inovações que nos levam a um problema que, se por um lado se opõe ao dogmatismo, por outro nos leva ao abandono dos princípios do marxismo-leninismo e das experiências de validade universal do movimento revolucionário com uma vulgar preocupação em dar valor às "novidades" sem, no entanto, verificar sua validade de maneira criteriosa.

Nas universidades a derrota do marxismo se deu justamente pela separação entre o marxismo e o leninismo, como se negar o desenvolvimento da teoria em sua unidade fosse uma inovação. O que se rejeita de Lênin? Unicamente o papel revolucionário e de vanguarda da classe operária, substituindo-o pelo papel de vanguarda dos intelectuais e da pequena burguesia urbana. Rejeita-se a concepção de aliança da classe operária com o campesinato substituindo-a por uma aliança indefinida de forças sociais heterogêneas. Rejeita-se a teoria do Estado - que o concebe como instrumento de dominação de classe, donde decorre a noção de ditadura do proletariado. Refuta-se a teoria do Partido - como fração mais consciente da classe trabalhadora - substituindo-o por um amálgama sem caráter de classe. Na medida em que se refuta a crítica leninista à democracia burguesa e ao parlamentarismo burguês como formas políticas de opressão econômica e social, descobrem-se valores “novos” (que nada mais são que os valores da burguesia) que sobrepõem aos objetivos de emancipação social. Põe-se em questão a validade do partido revolucionário e da luta de classes. Acreditando inovar, os novos “marxistas” repõem na ordem do dia ideias ultrapassadas, desacreditadas já na época em que o próprio Lênin combatia a velha socialdemocracia.

Dizia Marx que “a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxilio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar e nessa linguagem emprestada”. Parece que os “espíritos” da socialdemocracia do passado voltaram a nos assombrar. A “nova conformação histórica” – ou seja, o fim da URSS – parece sugerir que fomos derrotados e que todo o arcabouço teórico e todas as concepções que forjamos precisam ser refutados. Resgata-se a validade universal dos princípios democráticos e anuncia-se que nessa nova etapa já não haverá revoluções (como já decretaram Bernstein e Kautsky). Substitui-se a classe trabalhadora pela “maioria”. O aperfeiçoamento das instituições democráticas levaria essa “maioria” ao poder.

O partido “moderno”, de “leninismo contemporâneo” então, já não é mais o partido da classe. É um partido que pretende representar no parlamento os interesses de uma “maioria”, onde todas as concepções teóricas são bem vindas. Do leninismo, despido de seu caráter revolucionário e de classe, conserva-se apenas a diretiva do centralismo democrático, que acaba se tornando apenas burocrático devido à falta de democracia interna, ao mandonismo e à aversão à boa prática da crítica e da autocrítica. E, cabe ainda perguntar, que maioria é essa que se busca representar?

Lênin, assim como Gramsci, tinha claro que a classe revolucionária nem sempre é a maioria numérica. Não o era na revolução Francesa – onde a burguesia revolucionária aliou-se a outras classes – e tampouco o era o proletariado na Rússia revolucionária de 1917. Dificilmente será em algum momento histórico. Não é o número de indivíduos que compõem a classe trabalhadora que determina seu papel histórico. Mas sua situação social de oposição ao velho regime. É essa situação que define a classe trabalhadora como a classe capaz de dirigir a derrubada do capitalismo e a construção de uma sociedade socialista.

O Partido Comunista é o partido da classe trabalhadora. Mais do que isso: é a fração mais consciente dessa classe e é isso que o define. Sua teoria orientadora é o marxismo-leninismo, evidentemente entendido como uma teoria viva, em permanente construção. O Partido Comunista é o “partido de novo tipo”, conforme Gramsci, porque é uma organização diferente dos partidos da burguesia. Participa da institucionalidade quando pode, disputa a hegemonia na sociedade e, por meio de uma forte disciplina interna, está preparado para todas as formas de luta. Este deve ser o PCdoB.

Rita Coitinho é militante do PCdoB Santa Catarina.

domingo, agosto 11, 2013

Leitura recomendada, junto com o texto de Jorge Dimitrov, logo abaixo!!!

Defender o caráter revolucionário do Partido Comunista

Desde a derrocada das primeiras experiências de construção do socialismo na ex-União Soviética e países do Leste europeu, o mundo tem passado por muitas transformações. Radicais alterações na correlação de forças entre as correntes revolucionárias e o imperialismo ainda marcam negativamente o desenvolvimento da luta de libertação nacional e social dos povos e dos trabalhadores em todo o mundo.
Por José Reinaldo Carvalho
Se bem seja verdade que no início do século 21 se operam lentamente modificações positivas na acumulação de forças, é forçoso reconhecer que ainda vivemos no quadro geral da derrota histórica das forças da revolução e do socialismo, inteiramente contrastante com a época gloriosa da história da humanidade, que vem desde 1848, quando Marx e Engels escreveram o documento fundador do socialismo científico, o Manifesto Comunista.
É inegável que a partir deste evento, os trabalhadores e os povos oprimidos lançaram-se em epopeias gloriosas para “conquistar os céus de assalto”, e efetivamente alcançaram marcantes vitórias que condicionaram o desenvolvimento de toda uma época histórica. Os marcos fundamentais dessa época estão na Comuna de Paris (1871), na revolução Soviética (1917), na construção do socialismo longo do século 20 e nas lutas anticolonialistas e anti-imperialistas dos povos e nações oprimidos.
Foi a grande época de afirmação teórica e prática do partido comunista. Igualmente é inegável que ao serem liquidadas essas conquistas, a história deu um grande salto para trás, o que obviamente influi no rebaixamento do nível de consciência e no surgimento de tendências à capitulação.
Tendo destruído importantes conquistas civilizacionais, a derrota histórica do socialismo espalha seus efeitos deletérios, sobretudo no plano da subjetividade. Princípios da teoria e da prática revolucionárias são alvo de sistemática negação e a aparente força dos fatos é tão avassaladora que os dogmas revisionistas que se apresentam como versões rebuscadas do liquidacionismo e do oportunismo de direita, adquirem foro de cidadania e passam a ser objeto de culto. O próprio conceito de partido comunista, sua necessidade como instrumento para dirigir a luta emancipadora da classe operária é posto em causa. Os processos atuais de transformação política e social prescindiriam supostamente de um partido desse tipo e, no caso de sua preservação, deveria passar por tamanhas modificações políticas, organizativas e até mesmo ideológicas, que se transformaria em seu contrário, dele mantendo-se não mais que o nome, mas não a identidade nem a essência e o caráter.
Num ambiente de ataque às conquistas do proletariado e de ofensiva ideológica contra os valores do socialismo e os princípios do partido comunista, é comum a tendência a adaptar-se à ideologia dominante, a achar superado o corpo doutrinário do marxismo-leninismo, o arcabouço teórico-filosófico do socialismo científico e refugiar-se em formulações supostamente “contemporâneas”.
É meritório o esforço que o PCdoB faz para, mantendo a sua essência, a sua identidade de partido de classe cujo objetivo programático é o socialismo, navegar nas procelosas águas da contrarrevolução da atualidade e buscar meios, modos e formas novos de atuação, a fim de credenciar-se como alternativa política, evitar o isolamento e escapar à atuação caricatural de uma seita desligada da realidade.
Principalmente através de uma formulação programática consentânea com a realidade do Brasil e do mundo e de uma postura audaciosa na aplicação de uma tática ampla, combativa e flexível, o Partido assume o desafio de crescer, tornar-se uma poderosa força política, eleitoral, de massas, sob a direção de quadros política e ideologicamente preparados. Não há cartilhas, modelos, esquemas nem dogmas para nos ensinar como fazê-lo. Vamos aprendendo na prática, confiando na perspectiva histórica. Apoiar governos progressistas e deles participar são circunstâncias fortuitas que a história nos colocou. Saber tirar proveito disso para acumular forças está mostrando ser um caminho válido para o credenciamento político do Partido e seu afiançamento perante as classes trabalhadoras como força capaz de conduzir uma revolução político-social.
Por meio das teses em debate no 13º congresso, a direção do PCdoB faz um esforço de sistematização da atual experiência de construção partidária, na nova época histórica, em termos mundiais, e no novo quadro político, no plano nacional.
Mas o documento contorna o que me parece ser o principal desafio do momento no que se refere à existência do Partido: crescer, defendendo ao mesmo tempo o seu próprio caráter comunista e revolucionário. Circula no Partido a concepção – que se tornou predominante em outras correntes que lutavam pelo socialismo e depois o renegaram – de que o movimento tático é tudo e o objetivo final, nada. Com o agravante de que movimento tático se confunde com ação no e do governo, limitando-se a isso o horizonte do Partido – por mais que os seus documentos fundamentais digam o contrário. É corrente também no Partido – não gozando de foro formal de cidadania, mas desfrutando de amplo espaço – a concepção liquidacionista de que a “forma partido” está superada.
É insofismável que vivemos um período de conquistas e de crescimento quantitativo, bem assim da influência política do Partido. Mas não devemos ler a realidade como Polyana e ver sempre um lado bom naquilo que não anda bem. Podemos e devemos aproveitar o debate congressual para fazer com frontalidade – sem crispações, açodamentos nem divisões – com a responsabilidade que temos, o bom combate ideológico, para soerguer um Partido Comunista à altura dos seus desafios históricos. Até porque o bom combate às tendências ideológicas malsãs é indispensável para manter o leme da própria condução política do Partido.
Esta é a razão por que proponho que o tema sobre o Partido não seja tratado apenas sob a chave geral de “Virtudes e Vicissitudes”, proposta nas teses, mas sob uma ótica mais ampla e de fundo sobre o caráter do Partido, seus objetivos permanentes, o sentido estratégico de sua ação e a missão histórica dos comunistas.
Em uma realidade em mutação, decerto que os princípios também são adaptáveis e alguns mesmo deixam de ser vigentes. Não há problema em flexibilizar normas e formas, nem se deve perseguir a construção do Partido segundo modelos que foram úteis em outras latitudes e épocas. É de grande valor prático experimentar novas formas de atuação, inventar novos arranjos organizativos, novos métodos de ligação com as massas. Contudo, a arte e a ciência que se exige do nosso grande coletivo é fazer isso aperfeiçoando o caráter do Partido como o partido da luta de classes, da revolução, da luta pelo socialismo e do ideal comunista.

sexta-feira, agosto 09, 2013

OS ENSINAMENTOS SEMPRE ATUAIS E IMPRESCINDIVEIS DE UM LÍDER REVOLUCIONARIO COMUNISTA!!!

Entrevista com Jorge Dimitrov


Augusto Buonicore *

7º Congresso da Internacional Comunista conclama a unidade popular contra o facismo

O ambiente do lado de fora daquele imenso salão, onde acabava de se reunir a plenária final do 7º Congresso da Internacional Comunista, estava bastante agitado e tomado por um esfuziante otimismo - como se a esperança tivesse vencido o medo. Os delegados de vários países se despediam e se desejavam boa sorte. Mas, infelizmente, muitos deles não poderiam deixar o solo soviético porque seus países eram como pátrias ocupadas por um exército invasor. Lá o fascismo havia chegado ao poder e esmagado todo e qualquer vestígio de liberdade democrática. Entre aqueles rostos variados, representando quase todos os povos da terra, também era possível notar a ausência de vários dirigentes comunistas como Gramsci e Thaelmann, que padeciam em prisões fascistas.


O jovem jornalista brasileiro não conseguia esconder seu nervosismo – e certa ponta de orgulho - por estar na presença daqueles que eram, segundo ele, os representantes da vanguarda do proletariado mundial. O seu objetivo era conseguir uma entrevista exclusiva com o presidente da Internacional e o responsável pela apresentação do principal informe daquele conclave memorável: Jorge Dimitrov.


Dimitrov havia se tornado mundialmente conhecido quando, em 1933, no Tribunal da Leipzig enfrentou de maneira altiva às falsas acusações nazistas de que os comunistas haviam incendiado o Reichstag. Passado poucos anos já era, ao lado de Stalin, uma das figuram mais conhecidas e respeitadas do movimento comunista internacional. Era justamente este homem que, pretensiosamente, pretendia entrevistar e, talvez, trocar algumas impressões sobre o quadro mundial.

Um funcionário franzino e muito amável conduziu-o até a sala da presidência e num espanhol arrastado pediu que esperasse um pouco. Cerca de meia hora depois – um tempo infindável para aquele rapazote, mas uma fração de tempo insignificante para a revolução mundial – entrou na sala o eminente dirigente comunista acompanhado do interprete, o mesmo funcionário que o conduzira até ali.

Sentaram-se num amplo e confortável sofá. Dimitrov, calmamente, deu uma grande tragada em seu cachimbo e uma fumaça de aroma suave tomou conta do salão. Depois olhou, com um ar paternal, o inseguro jornalista e exclamou sorridente: “vamos começar a entrevista?! Afinal, é para isso que estamos aqui”. Sim, era para isso que estavam ali. O jovem pigarreou e, quase balbuciando, deu início às primeiras perguntas. Este 20 de agosto de 1935 seria, definitivamente, seu dia de glória. Respirou fundo e começou apresentar suas perguntas.

         
Jornalista: O principal informe desse congresso versou sobre o fascismo e a necessidade e os meios de combatê-lo. Por que isso? O fascismo não representa apenas uma simples mudança na forma de dominação burguesa? Então, por que colocá-lo como o “pior inimigo da classe operária”?
         
Dimitrov: A subida do fascismo ao poder não é uma simples mudança dum governo burguês, mas sim, a substituição de uma forma estatal de dominação de classe da burguesia – a democracia burguesa – por outra das suas formas, a ditadura terrorista declarada. Ignorar essa diferença seria um grave erro, que impediria o proletariado revolucionário mobilizar as mais amplas camadas de trabalhadores da cidade e do campo contra a ameaça de tomada de poder pelos fascistas, assim como tirar proveito das contradições existentes no seio da própria burguesia.

         
Jornalista: O que representa o fascismo no poder? Existem diferenças entre os diversos tipos de fascismo na atualidade?


Dimitrov: O fascismo é a ditadura terrorista aberta dos elementos mais chauvinistas e mais imperialistas do capital financeiro. A sua variedade mais reacionária é o alemão. Este atua como tropa de choque da contra-revolução internacional, como incendiário principal da guerra imperialista, como instigador da cruzada contra a União Soviética.


Jornalista: O que permitiu que o fascismo chegasse ao poder em tantos países? Qual responsabilidade cabe aos sociais democratas e comunistas?

Dimitrov: Os motivos são vários. O fascismo chegou ao poder, antes de mais nada, porque a classe operária  achava-se dividida, desarmada política e organicamente frente a burguesia que partia para a ofensiva. Triunfou também porque o proletariado se encontrava isolado dos aliados naturais, os camponeses e a pequena-burguesia urbana. Quanto às responsabilidades da social-democracia só tenho a dizer que: se no ano de 1918, quando a revolução explodiu na Alemanha e na Áustria, o proletariado tivesse marchado pelo caminho dos bolcheviques russos, hoje não haveria fascismo. Não seria a burguesia, mas sim, a classe operária, a dona da situação na Europa. Nas nossas fileiras, por outro lado, existia a inconcebível subestimação do perigo fascista que, até o presente momento, não foi liquidado.

Jornalista: Teria predominado o esquerdismo e o sectarismo nas fileiras comunistas?

Dimitrov: Sim! O esquerdismo entre nós já não é uma “doença infantil”, como dizia Lênin, mas um vício arraigado, e sem nos livrarmos dele não poderemos criar uma Frente Única proletária.  Na situação atual, o sectarismo orgulhoso, satisfeito da sua estreiteza doutrinária, satisfeito com seus métodos simplistas para tentar resolver problemas complicados sobre a base de esquemas cortados por um modelo pronto, distanciado da vida real das massas, entorpece nosso esforço de construir a Frente Popular.

         
Jornalista: A partir da experiência histórica acumulada, você acha que era possível ter impedido a ascensão do fascismo?

Dimitrov: Isso dependia antes de tudo da combatividade e da coesão das suas forças proletárias contra a ofensiva do capital e do fascismo. Dependia de uma política justa em relação aos seus aliados naturais: o campesinato e a pequena-burguesia urbana. Dependia da ação do proletariado, não deixando ao fascismo a iniciativa; dando-lhe golpes decisivos, fazendo-lhe frente a cada passo e não permitindo-lhe conquistar posições. Advirto ainda que, atualmente, não devemos alimentar ilusões de que o fascismo cairá por si mesmo. Só a atividade revolucionária da classe operária contribuirá para que os conflitos que surgem inevitavelmente no campo da burguesia sejam aproveitados para minar a ditadura e derruba-lo.

         
Jornalista: Depois de anos de ásperos conflitos, a Internacional Comunista sinalizou para uma aproximação com a II Internacional. Parece-me que isto é uma tática justa para enfrentar a ofensiva do fascismo mundial. Mas isto não seria tarde demais? A simples somatória dos membros das duas internacionais seria ainda suficiente para barrar a onda reacionária?

Dimitrov: Declaramos que a Internacional Comunista e as suas sessões estão dispostas a entrar em negociações com a II Internacional e as suas sessões respectivas para a criação da unidade da classe operária na luta contra a ofensiva do capital, contra o fascismo e contra a ameaça de uma guerra imperialista. Acredito que as ações conjuntas das ambas internacionais não se limitariam a exercer influência sobre os seus atuais membros, exerceriam também uma influência poderosa nas fileiras dos operários católicos, anarquistas e não-filiados, inclusive sobre aqueles que, momentaneamente, têm sido vítimas da demagogia fascistas. Ainda mais, a potente Frente Única do proletariado exerceria uma enorme influência sobre todas as demais camadas do povo trabalhador; sobre os camponeses, sobre a pequena burguesia urbana e sobre os intelectuais.


Jornalista: Existiu resistência dos comunistas em trabalhar junto com os social-democratas e estabelecer um programa mínimo de ação conjunta?

Dimitrov: Antes, muitos comunistas temiam que fosse uma manifestação de oportunismo de sua parte o fato de não contrapor a cada reivindicação parcial dos social-democratas as suas próprias reivindicações duas vezes mais radicais. Isso era um erro ingênuo. Se os social-democratas reclamavam, por exemplo, a dissolução das organizações fascistas, nós não temos porque ajuntar “e a dissolução da polícia do Estado também”. Deveríamos dizer aos operários, em vez disso: estamos dispostos a aceitar esta reivindicação do vosso partido como reivindicação da Frente Única do proletariado e lutar até o fim para conquistá-la. Empreendamos a luta juntos!

         
Jornalista: Qual é a grande tarefa do movimento comunista no presente momento?
         
Dimitrov: Temos como tarefa especialmente importante a criação de uma extensa frente popular antifascista sobre a base da Frente Unida proletária. O êxito da luta do proletariado está intimamente ligado à criação da aliança do proletariado com o campesinato trabalhador e com as massas mais importantes da pequena burguesia urbana, que formam a maioria da população, inclusive nos países industrialmente desenvolvidos.
         
Jornalista: Poderia exemplificar esta idéia em propostas concretas para alguns países?
         
Dimitrov: Exemplifico.  No caso dos Estados Unidos poderia ser a criação de um partido de massas dos trabalhadores, partido de operários e pequenos proprietários rurais (os farmers). Esse partido seria uma forma específica de frente popular de massas na América do Norte.  Ele não será naturalmente, nem socialista nem comunista. Mas, teria que ser um partido antifascista. Na Inglaterra, por exemplo, estamos dispostos a apoiar a formação de um governo trabalhista. Não esperamos dele que realize medidas socialistas e sim que defenda os interesses econômicos e políticos dos trabalhadores e faça frente à ofensiva do capital e do fascismo e à preparação de uma nova guerra imperialista.

Jornalista: Isso não faria os comunistas perderem a sua fisionomia e serem tragados pelo possibilismo reformista social-democracia?

Dimitrov: Este é sempre um risco. Por isso os comunistas não podem renunciar, nem por um minuto, ao seu trabalho próprio e independente de educação comunista, de organização e mobilização das massas. Sem abrir mão de firmar acordos de curto e longo prazo sobre ações comuns com os partidos social-democratas, os sindicatos reformistas e as demais organizações dos trabalhadores contra os inimigos da classe operária. Ao mesmo tempo em que cumprimos lealmente as condições de acordos firmados com eles, desmascararemos implacavelmente qualquer sabotagem cometida contra as ações conjuntas por aqueles que tomam parte na Frente Única.

Jornalista: Até hoje os comunista têm se recusado a apoiar e participar de governos nos marcos do capitalismo. Eu pergunto: se nas atuais condições se formassem governos antifascistas - de caráter não socialista - os comunistas estariam dispostos a apoiar e até participar deles?
         
Dimitrov: Por exemplo, se o movimento antifascista na França levasse à formação de um governo que lutasse contra o fascismo de modo efetivo; um governo que pusesse em prática o programa de reivindicações de frente popular antifascista, os comunistas, sem deixarem de serem partidários dos poder soviético, estariam dispostos, ante o crescente perigo fascista, apoiar tal governo. Vou mais longe: Se nos perguntam se nós, comunistas, lutamos sobre o terreno da frente unida somente por reivindicações parciais ou estamos dispostos a compartilhar as responsabilidades caso se atinja a formação de um governo de frente unida, diremos, com plena consciência de nossas responsabilidades: sim!, ... se produzir uma situação na qual a criação de um governo de frente popular antifascista seja não somente possível mas indispensável, no interesse do proletariado, aceitamos esta eventualidade e, sem nenhuma vacilação, nós nos declaramos à favor da criação desse governo.

         
Jornalista: Esta proposta de governo de Frente Popular não pode se confundir com as teses reformistas de uma possível “transição pacífica ao socialismo”, através da legalidade democrática burguesa? Falar em se buscar “formas de transição” e de “aproximação” não é cair na velha cantinela reformista e romper com as teses leninistas?

Dimitrov: Bobagem! Há 15 anos, Lênin nos convidava a concentrar toda a atenção em “buscar formas de transição ou de aproximação da revolução proletária”. Pode ocorrer que o governo da Frente Única seja, numa série de países, uma das formas transitórias mais importantes. Os doutrinários de “esquerda” sempre menosprezam esta importante indicação de Lênin, falando somente do “objetivo”, como propagandistas limitados, sem preocupação com as “formas de transição”. Por outro lado, os oportunistas de direita (reformistas) tentaram estabelecer uma “fase democrática intermediária”, especialmente entre a ditadura da burguesia e a ditadura do proletariado para sugerir à classe operária a ilusão de uma passagem parlamentar pacífica de uma ditadura para outra. A esta “fase intermediária”, “fictícia”, a chamavam também “forma de transição” e inclusive invocavam o nome de Lênin. Mas não foi fácil cobrir a fraude, pois Lênin falava de uma forma de transição e de aproximação da “revolução proletária”, isto é da derrubada da ditadura burguesa e não de uma forma transitória qualquer entre a ditadura burguesa e a proletária.
         
         
Jornalista: Como fica o Partido no seio da Frente Única? Deve reduzir sua visibilidade para não estreita-la? Deve se utilizar dela para crescer suas fileiras?

Dimitrov: Quando nós comunistas fazemos todos os esforços para estabelecer a Frente Única, não o fazemos de um ponto de vista mesquinho de recrutamento de novos filiados para o Partido Comunista. Mas, precisamente, porque queremos fortalecer seriamente a Frente Única, devemos fortalecer também, em todos os aspectos, o Partido Comunista e aumentar seus efetivos. O fortalecimento dos partidos comunistas não representa os interesses limitados do partido, mas sim, um interesse de toda classe operária. De fato existem nas nossas fileiras camaradas que defendem a diminuição do papel do Partido Comunista na Frente Única e passam a conciliar com a ideologia social-democrática. Este desvio de direita também deve ser duramente combatido.

Jornalista: O movimento sindical é a base de qualquer projeto bem sucedido de Frente Única do proletariado e hoje ele está bastante dividido. Qual a saída?

Dimitrov: Saudamos a proposta da Internacional Sindical Vermelha à Internacional de Amsterdã de iniciar a discussão conjunta sobre as condições, os métodos e as formas de unificação do movimento sindical mundial. Defendemos que os pequenos sindicatos vermelhos se integrem aos grandes sindicatos reformistas, ligados à Central social-democrata. Nos países que existem grandes sindicatos vermelhos e reformistas conclamamos a convocação de congressos de unificação sobre uma plataforma de luta contra a ofensiva do capital e a salvaguarda da democracia sindical.

Jornalista: E nos países sob a dominação fascista, onde não existe liberdade sindical e os sindicatos são meros aparelhos do Estado? Neste caso como pensar em construir um embrião de unidade proletária antifascista?

Dimitrov: Aqui seguimos os ensinamentos de Lênin. Para os comunistas dos países fascistas é de capital importância estar em todas as partes onde estão as massas. O fascismo retirou dos operários as suas próprias organizações legais, O fascismo impôs-lhes as organizações fascistas por meio da violência e nestas encontram-se, seja pela força ou, em parte, voluntariamente. Estas organizações de massa do fascismo podem e devem ser o nosso campo legal de operação, a partir do qual entraremos em contato com a massa. Quem não compreende a necessidade de empregar uma tática semelhante com respeito ao fascismo, quem considera tal atuação ‘humilhante’, poderá ser um excelente camarada, mas, se me permitam que o diga, é um charlatão e não um revolucionário; ele não saberá conduzir as massas para a derrubada da ditadura fascista.

Jornalista: Por fim gostaria de abordar uma questão sempre delicada para os comunistas e internacionalistas: a questão nacional. Os fascistas, me parece, usaram e abusaram dela na sua demagogia para ganhar as massas populares. Qual deveria ter sido a posição dos comunistas diante desse problema crucial?

Dimitrov: É verdade. Os fascistas revolveram a história de cada povo para apresentarem-se como herdeiro e continuadores de tudo que havia de heróico no seu passado. Os comunistas acabaram, inconscientemente, contribuindo para isto. Assim, aqueles que não fazem nada para esclarecer ante as massas trabalhadoras o passado do seu próprio povo, com toda fidelidade histórica e sob a perspectiva marxista-leninista, e não buscam ligar a luta atual com as tradições revolucionárias do passado, entregam voluntariamente aos falsificadores fascistas tudo o que há de valioso no passado histórico da nação. Nós, os comunistas, devemos ser inimigos irreconciliáveis do nacionalismo burguês, mas quem pensa que isto lhes permite cuspir na cara de todos os sentimentos nacionais das massas trabalhadoras, está muito longe do bolchevismo e não compreendeu nada dos ensinamentos de Lênin sobre o problema nacional. O internacionalismo proletário deve “aclimatar-se” a cada país e lançar raízes profundas no solo natal. As formas nacionais, de que se reveste a luta proletária em cada país, não estão em contradição com o internacionalismo proletário, mas ao contrário, é precisamente sob estas formas que se pode defender também, com êxito, os interesses internacionais do proletariado.

Jornalista: A mesma coisa você poderia dizer sobre as conquistas democrático-burguesas?

Dimitrov: Exatamente. Nós somos partidários da democracia soviética, da democracia dos trabalhadores, a democracia mais conseqüente do mundo. Mas, defendemos nos países capitalistas, palmo a palmo, as liberdades democrático-burguesas contra as quais atentam o fascismo e a reação burguesa. Nós não somos anarquistas e não nos pode ser, de maneira alguma, indiferente qual regime político impera num dado país; se a ditadura burguesa em forma de democracia burguesa ou a ditadura burguesa, na sua forma mais descarada, fascista. Sem deixarmos de ser partidários da democracia soviética, defenderemos palmo a palmo as condições democráticas arrebatadas pela classe operária durante anos de luta acirrada e lutaremos decididamente por ampliá-las. O proletariado de todos os países verteu muito sangue para conquistar as liberdades democrático-burguesas e, é óbvio, que lute com todas as suas forças para conservá-las.

         
Jornalista: Qual seria a sua última mensagem ao proletariado do Brasil e do mundo?
         
Dimitrov: Que não desanimem diante do quadro mundial adverso. Lembrem-se sempre que a seu favor trabalha toda a marcha do desenvolvimento histórico. Os reacionários, os fascistas de todas as cores, a burguesia do mundo inteiro se esforçam em vão para voltar para trás a roda da história. Mas esta roda gira e continuará girando em direção da vitória definitiva do socialismo. Entretanto ainda falta uma coisa: a unidade dentro de suas fileiras proletarias. Por isso devemos fazer ressoar com força, no mundo inteiro, o grito de guerra da Internacional, o grito de Marx, Engels e Lênin: “proletários de todos os países, uni-vos!”.

         
A entrevista chegou ao final. Entrevistado e entrevistador já cansados despediram-se com um longo e caloroso aperto de mão. Dimitrov desejou sucesso ao proletariado brasileiro e ao seu partido, o Partido Comunista do Brasil. Vaticinou sorridente a breve derrocada do nazi-fascismo. Carlos – este era o seu nome - sabia que inúmeras e grandiosas tarefas esperavam aquele dirigente da Internacional e não queria mais atrapalhá-lo. O seu pensamento, rapidamente, voou até seu distante Brasil. Lembrou-se da Batalha na Praça da Sé, ocorrida no ano anterior, na qual o povo pôs para correr os integralistas e também dos primeiros comícios da Aliança Nacional Libertadora. O pessimismo, que chegou a atormentar seu espírito indomável, foi dissipado naqueles dias em Moscou. O futuro, definitivamente, não pertenceria ao fascismo.
Moscou – 20 de agosto de 1935

Notas
1: Esta entrevista não foi publicada no Brasil. Quando Carlos estava na URSS o governo Vargas aprovou a Lei de Segurança Nacional e fechou a Aliança Nacional Libertadora. Um mês após a sua chegada uma insurreição, comandada por Prestes, foi derrotada e nosso jovem repórter, ao lado de milhares de outros cidadãos, foi encarcerado. Dizem que, mesmo assim, ele não perdeu a esperança e continuou repetindo: “o futuro não pertencerá ao fascismo”.
2: O jornalista e a entrevista nunca existiram, mas as respostas de Dimitrov foram extraídas do seu famoso informe “A Ofensiva do fascismo e as tarefas da Internacional Comunista”,  pronunciado em 4 de agosto de 1935.
* Historiador, mestre em ciência política pela Unicamp