Médico
cubano, negro, vaiado pela pequena burguesia
*Carlos Pompe
No livro Nova classe
média?, o economista Marcio Pochmann mostra que
foram criados 21 milhões de novos postos de trabalho nos
últimos dez anos,
sendo 94,8% deste total com salários equivalentes a 1,5
mínimo. Estes
trabalhadores estão sendo chamados de “nova classe média”
pelos oligopólios
da comunicação brasileira. Na verdade, não integram a classe
média”. Mas a
velha classe média continua atuante no país, e é ela que,
servil aos interesses
da classe que lhe é superior, a burguesia, hostiliza os
médicos cubanos que
vieram atuar no Brasil e se enoja das políticas sociais que
beneficiam a classe
que considera “inferior” a si – a classe proletária,
trabalhadora.
“Seja pelo nível de
rendimento, pelo tipo de ocupação, pelo perfil e atributos
pessoais, o grosso da população emergente não se encaixa em
critérios sérios
e objetivos que possam ser claramente identificados como
classe média”,
escreve Pochmann. Seja pelo nível de rendimento, pelo tipo de
ocupação,
pelo perfil e atributos pessoais, o grosso dos médicos e
demais pessoas que
participaram dos protestos contra o programa + Médicos e
outras ações sociais
do governo e contra a política e os políticos podem ser
claramente identificados
com a velha classe média brasileira, a pequena burguesia.
Aquela pequena burguesia que compôs o Integralismo, no início
do século
passado; que apoiou a ditadura getulista durante o Estado
Novo; que marchou
“com Deus e pela liberdade” (na verdade, pelo golpe militar)
em 1964. Essa
pequena burguesia que não se conforma em perder a relação de
criadagem
dos trabalhadores domésticos, que herdou das centenas de anos
em que a
escravidão imperou no país, agora que eles conquistaram
direitos trabalhistas.
Essa gente que acha que os médicos cubanos “tem cara de
empregada
doméstica” – talvez achando que sua própria cara pequeno
burguesa seja
mais assemelhada à burguesia estampada na revista Caras do
que à cara do
trabalhador que vê amontoado no ônibus, no congestionamento,
ao passar
com seu carro último tipo (financiado).
No segundo semestre de 1946, numa reunião de sua Organização
de Base
no Partido Comunista, o escritor Graciliano Ramos questionou
que a pequena
burguesia seja realmente uma classe. “É uma camada vacilante,
e diremos
talvez sem contrassenso que o que a caracteriza é a falta de
caráter. Subindo
um pouco, tenta insinuar-se no capital – e é favorável à
violência, detesta
reuniões, pensa em conformidade com a polícia, teme a foice,
o martelo, a cor
vermelha, afeiçoa-se ao golpista e ao delator; largando o
emprego, esgotada a
caderneta da caixa econômica, avizinha-se do proletariado – e
entra nas filas,
é pingente de bonde, assiste a comícios, descompõe a Light,
excede-se em
parolagem demagógica”.
Marx considerava, no
Dezoito Brumário, a pequena burguesia “uma classe
de transição” (assim,
em itálico), na qual os interesses da burguesia e do
proletariado perdem simultaneamente suas arestas. O livro do
fundador do
socialismo científico foi escrito quase 100 anos antes do
pronunciamento do
escritor brasileiro – como se vê, a classe média é velha de
séculos, apesar de
hoje usar a alta tecnologia para difundir seus preconceitos
arcaicos e ódio “aos
de baixo”.
*Carlos Pompe é jornalista, militante comunista revolucionario, editor do "Vermelho/DF" e dirigente do PCdoB do Distrito Federal
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