É o Partido, camaradas!
Um tema crucial que nunca abandonou as reflexões partidárias, mas que de uns tempos para cá, sobretudo no presente processo do 13° Congresso, vem se impondo com ênfase, dizem respeito à natureza, missão e princípios ideológicos, políticos e organizativos norteadores do partido comunista.
Por Luiz Manfredini *
O tema é crucial porque a existência
do partido comunista é decisiva para impulsionar a luta socialista, em
produtiva, sinérgica interação com as demais forças de esquerda que também
reivindicam o socialismo. A essencialidade desse tipo de partido decorre de sua
responsabilidade histórica de perseguir a construção do sujeito político – isto
é, a massa consciente de trabalhadores e seus aliados – capaz de levar adiante
a transformação radical da sociedade, com vistas à substituição do capitalismo
pelo socialismo.
No artigo “Partido das grandes causas
do povo brasileiro e da humanidade”, veiculado pelo Vermelho por ocasião do 91o
aniversário do PCdoB, o camarada José Reinaldo Carvalho sintetizou com propriedade:
“A outra pedra de toque do pensamento e da ação do PCdoB é o esforço
persistente para construir um partido comunista organicamente forte, ideológica
e politicamente capaz, à altura da sua missão histórica, ligado às massas, em
especial aos trabalhadores, um Partido com força militante, influência política
ampla, presente nos acontecimentos candentes, dotado de amplo horizonte
histórico, cultural e teórico, enraizado no solo nacional, patriótico e
internacionalista”.
A trajetória de um partido comunista
deve ser considerada sempre em perspectiva, no cenário dinâmico de seus
objetivos estratégicos e não apenas diante das emergências da tática. E, outras
palavras, o que verdadeiramente interessa e serve à causa revolucionária, no
âmbito dos debates do 13o Congresso, é verificar se o partido que estamos
construindo hoje, de acordo com as circunstâncias históricas do momento e todas
as suas possibilidades e limitações, fortalece ou não a acumulação estratégica
de forças. Em outras palavras, a tática deve ser vista no arco de um horizonte
estratégico. O contrário nos conduzirá a um taticismo esvoaçante e
inconsequente.
A construção de um partido nos moldes
propostos, com essa visão estratégica, não é tarefa para quando estivermos nas
portas do socialismo, mas para já. Caso contrário, as portas do socialismo
estarão fechadas para nós.
Obviamente a ideia de um partido de
massas e de quadros está aberta às indicações contemporâneas da luta política e
social. Aqui não se defende um partido cristalizado, impermeável ao que de novo
o desenvolvimento histórico nos vai apresentando. Não seríamos, se o
fizéssemos, os dialéticos que pretendemos ser. Mas atualização alguma poderá
negar questões essenciais como o fundamento teórico e o caráter de classe do
partido, sua identidade comunista, sua concepção organizativa, seus
compromissos estratégicos, pois daí não seria atualização, mas capitulação.
As teses congressuais reconhecem que
o Partido, no período examinado, viveu “novas oportunidades, desafios e
riscos”. Numa trajetória considerada fundamentalmente positiva, surgiram
pressões próprias da época, voltadas para “o rebaixamento do papel estratégico
do Partido”. Alinham, as teses, os riscos mais perniciosos a evitar, entre os
quais o liberalismo, o corporativismo, o dogmatismo, o carreirismo e o
personalismo. Não é de subestimá-los, até porque não me parecem, tais desvios,
apenas riscos (no sentido de probabilidade de existir). Já estão presentes –
por vezes furtivamente – em diversas circunstâncias. Revelam-se, por exemplo,
num certo discurso que propõe, ainda que de modo subliminar, a adoção de um
“pragmatismo controlado” com vistas a resultados eleitorais mais favoráveis, ou
o que prega um “partido sem porteiras”, conduzindo-o, segundo temo, a um
perigoso estado de obesidade mórbida. A gana eleitoral que se percebe acaba por
facultar as fileiras partidárias, indiscriminadamente, a quem oferecer maior
punhado de votos, mesmo que, com isso, o Partido venha a se tornar mero
trampolim para carreiras nada recomendáveis. A esse impulso pela formação, a
qualquer custo, de bancadas parlamentares, vê-se, em algumas situações, forte
apetite por cargos governamentais, muitas vezes sem conexão com a tática
partidária. São alguns exemplos de como o viés eleitoral termina, nesses casos,
por embaçar os dois outros (e insubstituíveis) pés da ação partidária, ou seja,
a luta de massas e a luta de ideias.
Não é por menos que as teses dedicam
todo um trecho (“Perspectivas atualizadas para a edificação partidária”) para
advertir contra tais tendências negativas. Não identificadas e não combatidas
adequadamente, contribuem – até decisivamente – para nublar o rumo estratégico
do Partido. E, na medida em que turvam esse rumo, não ajudam na acumulação de
forças em direção a ele. Ou seja, corre-se o risco de adotar – ainda que
involuntariamente - o conceito fundante do revisionismo moderno: “o movimento é
tudo, o objetivo final, nada”.
Frente a isso as teses orientam
“tratar de maneira combinada três formas de luta entrelaçadas para acumular
forças em caráter estratégico, portanto revolucionário, sem unilateralismos: a
luta social de massas, a luta política-eleitoral e a luta de ideias, todas elas
com caráter político. Junto a isso, disputar ativamente as bases sociais
fundamentais, a saber, os trabalhadores, a juventude e as mulheres. E seguir
aprimorando o centralismo democrático, para um partido com liberdade de opinião
e unido na ação concreta em cada caso”. O que indicam as teses, no entanto,
deve se tornar realidade mais efetiva e abrangente.
Refletir criticamente sobre essas e
outras questões importantes para a luta socialista no Brasil, fortalecendo o
protagonismo revolucionário do PCdoB, é o sentido maior dos debates do 13o
congresso. Afinal, o grande encontro dos comunistas não deve se restringir às
loas e exaltações de praxe. O marxismo e o movimento comunista, desde os seus
primórdios, se desenvolveram a base de intensas reflexões e debates e quase
sempre em polêmica com ideias contrárias. Foi esse exercício dialético que o
robusteceu. E será sob o influxo de um pensamento vivo, crítico, que o PCdoB
fortalecerá seu protagonismo essencial frente aos desafios contemporâneos da
revolução brasileira.
* Luiz Manfredini é jornalista e escritor, militante do PCdoB no Paraná.
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