Acordo é vitória da Colômbia
Estas jovens e belas guerrilheiras sonham voltar para seus lares. Mas com direitos, justiça e igualdade!
JAIME
SAUTCHUK
(*)
O acordo entre o governo da
Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias (FARC), semana passada, é vitória
de uma luta de 50 anos e de toda uma nação. Na primeira fase, o acordo define a
questão agrária, item básico de um ajuste mais amplo, e foi aplaudido pelo
mundo inteiro, da ONU à Casa Branca.
Para alguns que, com apoio de
parte da mídia, sempre trataram as FARC como uma organização
“narco-terrorista”, agora é difícil ver o mundo enaltecendo as negociações
diplomáticas, iniciadas há 6 meses, sob a mediação dos governos da Noruega e
Cuba, e acompanhadas pelos do Chile e da
Venezuela. Mas isso é um detalhe, o importante é a dimensão do fato.
Em sua homilia do último
domingo, da janela do Vaticano, o Papa Francisco abençoou o acordo e disse orar
para que este seja um primeiro passo “para a paz permanente”. Antes dele, a
Conferência Episcopal da Colômbia (equivalente à CNBB no Brasil) havia emitido
comunicado entusiasmado, manifestando a fé dos bispos daquele país em que,
agora, “esteja aberto o caminho para a paz”.
No dia em que o acordo foi
selado, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-Moon,
fez questão de ele próprio anunciar o fato ao planeta. “É uma conquista
significativa e um passo importante para o mundo todo”, disse ele.
Em Washington, o governo dos
Estados Unidos também engoliu em seco e soltou um comunicado elogioso. O
porta-voz ajunto do Departamento de Estado, Patrick Ventrell disse que a Casa Branca “há muito
tempo apoia com força o presidente Manuel Santos e o governo da Colômbia em sua busca por uma paz duradoura e da
segurança às quais o povo colombiano tem direito”.
Coloca, pois, o acordo como
um feito do governo colombiano, como se fosse uma espécie de capitulação das
FARC. Em verdade, porém, o que foi aprovado é o centro do programa das forças
revolucionárias, apresentado ainda na década de 1960, quando adotou a luta
armada como forma de tentar mudar a Colômbia. Uma proposta das FARC, portanto.
Mas isso não é o mais importante.
É certo que sucessivos
governos da Colômbia não queriam coversa. Preferiam tentar massacrar as FARC
pelas armas. Foram formados, inclusive, truculentos grupos paramilitares, com
mais de cinco mil homens, que década após década combateram os revolucionários
sem as regras internacionais que impõem limites a esses conflitos, condenando
morte de civis, tortura etc., que esses grupos não respeitam.
Agora, não. Existe de fato
enorme boa vontade do governo do presidente Juan Manuel Santos, e isso é de
inegável valor. E, a bem da verdade, também o governo do presidente Barack
Obama apoia de fato essas negociações, o que é uma mudança importante. Os
governos anteriores dos Estados Unidos eram a favor do combate armado ao movimento
guerrilheiro.
Foi ele próprio, o presidente
Santos, quem anunciou, em rede nacional, os avanços obtidos nas negociações que
vêm sendo feitas em Havana, Cuba. Ele enumerou e detalhou os pontos centrais do
acordo já fechado.
A começar pela regularização das chamadas
“áreas liberadas”, que estima-se em 30% do território nacional, onde já foi
feita a reforma agrária, e a criação de um fundo para indenizações e para a
aquisição de novas terras.
Será criado um programa de
capacitação dos agricultores, com vistas à melhoria da produtividade, que,
segundo disse, é muito baixa. Anunciou, ainda, a definição de formas de
incentivo, com a facilidade de crédito oficial para aquisição de equipamentos e
todo tipo de insumo agropecuário.
Por fim, o que considerou
fator fundamental, será criado um amplo programa de saúde, educação, saneamento
básico e proteção social às famílias do campo. Ou seja, um plano de
desenvolvimento social pra ninguém botar defeito.
Pra colocar tudo isso em
prática, ele deu posse a um novo ministro da Agricultura e Desenvolvimento
Rural, o que, por si só, demonstra a confiança que ele deposita no acordo já
firmado.
O novo ministro é Francisco
Estupiñan Heredia, um experiente e respeitado professor universitário, que já foi
vice-ministro da Fazenda e, no momento, ocupava o cargo de presidente do Banco
Agrário da Colômbia.
Na fala de Santos, no
comunicado das FARC, na opinião dos diplomatas dos países mediadores e
acompanhantes, na de analistas de universidades e de organismos internacionais,
todos reconhecem, contudo, que este é um importante passo, mas ainda não é
tudo. Outros itens colocados na mesa podem emperrar as negociações.
São quatro os principais
itens ainda pendentes, que voltarão a ser discutidos no dia 11 de junho
próximo. O primeiro deles é o da deposição total de armas, com o qual, claro,
as FARC concordam. Mas, desde que outros tópicos também sejam aprovados.
O principal deles é o da
garantia de direitos políticos aos ex-guerrilheiros, o que inclui a possibilidade
de eles se candidatarem em eleições livres na Colômbia. Esse é um ponto que
encontra sérias resistências entre setores conservadores no país.
Mas acabará sendo acordado,
até porque há exemplos em diversas partes do mundo. Um deles: quando o governo
da Grâ-Bretanha firmou acordo semelhante com o Exército Republicano Irlandês
(IRA), o Sinn Féin, braço político da guerrilha, passou a lançar candidatos em
todas as eleições, apesar da resistência de conservadores de Londres.
Há mais dois itens importantes
no acordo com as FARC. Um, é a reparação das vítimas da prolongada guerra, de
ambos os lados, o que envolve complicadas imputações de responsabilidades e
formas de pagamento.
E, por fim, vem o combate ao
narcotráfico, no que ambos os lados concordam. O que pega é que as FARC
defendem que essa seja uma questão interna da Colômbia, o que implica a saída
das forças dos EUA que ainda estão por lá a título de combate aos traficantes.
Ou seja, as coisas estão
muito bem encaminhadas. E assim, a pujante Colômbia mostra ao mundo o seu
valor.
*Jaime Sautchuk é jornalista,
vice presidente do Cebrapaz/DF e defensor da solidariedade entre os povos e do
socialismo!
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