domingo, agosto 08, 2010

AINDA RELEMBRANDO 100 ANOS DE ADONIRAN BARBOSA.O POETA QUE CANTOU SUA CIDADE E AS QUEBRADAS DO MUNDO!!

Foto clicada por Jesus Carlos, da Imagemlatina, de um mural grafitado, na Praça Benedito Calixto, em Pinheiros, São Paulo!

O texto é homenagem a Adoniran e sua cidade, por João Teixeira, o da "Baiana"!

“Trem das Onze”, música-tema de SP,
é símbolo do museu-memória do Jaçanã

Não posso ficar nem mais um minuto com você/ sinto muito amor / mas não pode ser / moro em Jaçanã /se eu perder este trem/ que sai agora às 11 horas/ só amanhã de manhã....

A música-tema de São Paulo foi composta em 1962 por João Rubinato, o verdadeiro nome do saudoso Adoniran Barbosa, o menestrel da Paulicéia. “Trem das Onze” foi eleita como símbolo de São Paulo no concurso realizado pela Rede Globo. O páreo foi duro. O “Trem” venceu “Sampa” (“Alguma coisa acontece em meu coração/que só quando cruzo a Ipiranga com a avenida São João”), de Caetano Veloso. O compositor baiano colocou versos modernistas na linha melódica de “Ronda”, de Paulo Vanzoli, outro hit regional bem votado.
Como expoente máximo do samba paulista, “Trem das Onze” projetou o Jaçanã mundialmente. O bairro está associado à obra imortal na memória coletiva. Consagrou o Jaçanã assim como Noel Rosa com Vila Isabel. Existem no bairro bares, restaurantes e logradouros públicos com o nome da música. Uma travessa da avenida Guapira leva o nome da música. O samba paulista já foi gravado na Rússia, no Japão, na França e em outros países. Adoniran voltava de taxi de um show num circo de subúrbio, à época em que fazia sambas em homenagem ao Brás, à Casa Verde, o Bexiga, quando criou seu maior sucesso.
São Paulo era da garoa, terra de operários, poetas, cantores e sindicalistas. Seus subúrbios tinham bosques, e animais selvagens e uma frota de carros infinitamente menor que a de hoje.
O trem saía da rua João Teodoro às onze da noite e chegava à meia noite e meia no Jaçanã. A poesia da música, contudo, não reflete toda a realidade. Adoniran morava no Brás e freqüentava as rodas boêmias do Bexiga. A exemplo de Cartola, nos morros do Rio, era homem do povo, um poeta popular talentoso que falava errado como os personagens de suas músicas. É apontado como o maior no gênero, abordando como ninguém a São Paulo italianada, das malocas, do Brás, Bexiga e Barra Funda.
“O Arnesto nos convidou prum samba/ele mora no Brás/nóis fumo e num incontremu ninguém...
Adoniran estudava no Liceu de Artes e Ofícios. Era o “Charutinho”, o inesquecível personagem do programa “História das Malocas”, sucessão da época, na rádio Record. Sílvio Bittencourt, fundador da Associação Memória do Jaçanã, de 70 anos, não perdia o programa gravado ao vivo no auditório e conviveu com Adoniran. “Ele era espontâneo, começava a batucar e saía o samba”.
“...e além disso mulher/tem outra coisa/minha mãe não dorme enquanto eu não chegar/sou filho único/tenho minha casa para olhar/eu não posso ficar...
Segundo a imprensa de linotipos, o poeta sequer sabia onde ficava o Jaçanã. Teria citado o nome do bairro na letra para rimar com a palavra manhã. Bittencourt desmente esta versão. “Adoniran filmava na Cinematográfica Maristela aqui do bairro e tomava seus tragos no bar Gigantão”. Os artistas da antiga TV-Record dominaram os cenários ao vivo do Jaçanã. Filmaram lá “Os Xavantes”, com o humorista Pagano Sobrinho. “O Comprador de Fazendas”, com Anselmo Duarte e Procópio Ferreira. O álbum dos estúdios pode ser apreciado no museu.
Adoniran confirmou a versão oficial, mais tarde. Nos anos 70, fazia ponto à tarde na padaria ao lado do antigo Canal 4, na avenida Alfonso Bovero, hoje MTV. Entrevistado, negou que tivesse viajado no “Trem das Onze”. Adoniran, caipira do interior paulista, de Valinhos, nasceu em 6 de julho de 1910. Era do signo de Câncer. Faleceu em 23 de novembro de 1982, com 72 anos. Como artista regional, naturalmente mantinha vínculos com toda a Paulicéia, inclusive (e por que não?) com o Jaçanã. Seu hobby: fabricava brinquedos de lata na garagem de sua casa.
No túnel do tempo
Guardião da memória da região do sítio Guapira (“terra que tem ouro e lavras”, em tupi-guarani), origem dos bairros da atual zona norte de São Paulo (Santana, Jaçanã, Parque Edu Chaves, Vila Constança), Bittencourt preserva as relíquias do passado. A história do “Trem” tem versões conflitantes, mas a obra de Adoniran é inesquecível. Marcou gerações. O trem é o logotipo do museu-memória, que funciona precariamente num velho canteiro de obras do metrô, cedido gratuitamente. Os escolares que o visitam querem saber do trem, da estação, dos tempos memoráveis. O museu nasceu na garagem de sua casa com a presença de dona Matilde de Lutes Rubinato, esposa de Adoniran.
Funciona sem auxílio oficial, de órgãos públicos ou da iniciativa privada. A Secretaria de Bens Culturais do Estado de São Paulo poderá encampá-lo. A idéia nasceu em 1969, quando Bittencourt mudou para o bairro, onde criou a segunda rua de lazer em São Paulo. Fundou a Escola de Samba Flor de Maio, no Tucuruvi. Abnegado, Bittencourt o mantém com dinheiro do próprio bolso. Recebe R$ 400,00 como funcionário público aposentado.
Fotografias, discos, fantasias, documentos, mapas e utensílios estão deteriorando na umidade. Lá estão os trilhos de bitola estreita do trem, a lanterna, o boné do maquinista. As crianças adoram o túnel do tempo. Aprendem que lá fundaram a primeira escola de pilotagem de aviões do Brasil. Eduardo Pacheco Chaves (Edu Chaves) comprou enorme área de 1,2 milhão de hectares por 50 contos de réis, importando 21 aviões da Europa. As primeiras indústrias instalaram-se em 1918.
Vida no campo
A luz elétrica chegou em 1931, substituindo os lampiões a querosene. A área, cujo solo era rico em argila, fabricava o melhor tijolo de São Paulo. Em 19 de maio de 1965 acabou o ramal ferroviário de Areal até Guarulhos. Adoniran chorou vendo o destelhamento da estação. Os bondes também sumiram em 1968. “O trem não levava só passageiros. Os vagões também carregavam móveis tijolos, areia, cimento para a construção do reservatório Cabuçu”.
As carretas e carroças carregaram materiais de construção durante trinta anos, de 1920 até 1950. Havia um desvio do ramal ferroviário que penetrava na área das olarias, buscando materiais para a Aremina, o antigo fabricante de argilas. São Paulo tinha boiadas, vinhedos, olarias e chácaras. A ferrovia civilizou a vida rural.
“O trem era fundamental. As pessoas faziam piquenique no largo de Vila Galvão. Os peixeiros pescavam nos lagos. Haviam cavalos e cabritas, que pastavam com cincerro no pescoço. O trem soltava fagulhas que queimavam a roupa da gente, trabalhávamos com a roupa queimada, nos chamavam de Cantareira”. Pescavam no rio Tremembé.
Ainda vivo, o maquinista, Mario Pires, atropelava veados na mata, no trecho do caminho do Jaçanã-Vila Galvão. Nem tudo era beleza no bucolismo da paisagem suburbana. “Quando o trem das onze passou a ter bitola mais larga, passava rente às pessoas que atravessavam a ponte. Gritavam: ‘olha a cabeça!’. Muita gente morreu assim. O corpo ficava em Santana, a cabeça em Guarulhos”. Um desastre em 1944 na avenida Cabuçu matou mais de 50 pessoas.
“Se eu pudesse alegrar meu coração/e ir de trem pro Jaçanã/é impossível meus senhores/agora com o progresso poderemos ir de metrô/vai de uma hora à meia-noite/o trem das onze virou marco na história/o Jaçanã saúda Adoniran Barbosa/o hino do bairro guardamos na memória/e com saudades cantamos agora...
Com a mesma linha melódica de “Trem das Onze”, Bittencourt compôs estes versos com Maurílio Silva. Inspiraram-se no antológico samba de Adoniran. (Texto de João Teixeira)

3 comentários:

Ana Paula disse...

Olá Luiz. Tenho uma postagem em meu blog que fala de Adoniran do ponto de vista Histórico e empírico. Visite.
http://fharofhino.blogspot.com/2010/01/saudosa-maloca-sao-paulo-de-adoniran.html

Orlando & Crônicas disse...

Olá, Luís!
Estpenda postagem, excelente a qualidade de seu blog.
Parabéns!
Abraços, Orlando.

Ana Paula disse...

Luiz adorei sua visita. Volte outras vezes. Sou sua seguidora desde que fiz meu blog, um ano e pouco.
Abraços.