segunda-feira, dezembro 17, 2012

HEINE, O POETA QUE MARX QUERIA NA BAGAGEM!!!


Heine, o poeta que Marx queria na bagagem

Heinrich Heine, por  Charles Gleyre, em 1851




Por Carlos Pompe*
Há 215 anos, em 13 de dezembro de 1797, nasceu em Düsseldorf, Christian Johann Heinrich Heine. Considerado um dos maiores poetas do século XIX, Heine teve grande influência também no Brasil. Foi traduzido, do alemão, por Gonçalves Dias e Francisco Adolfo de Varnhagen – outras traduções de seus escritos, como as Machado de Assis (que depois aprendeu alemão e também traduziu a partir dos originais) e Álvares de Azevedo, foram feitas a partir de traduções francesas.
No século passado, Manuel Bandeira, Geir Campos, Augusto Meyer e Décio Pignatari, dentre outros, traduziram, do alemão, alguns poemas seus. Castro Alves escreveu Navio Negreiro, em 1868, inspirado no poema homônimo de Heine, escrito em 1853, e usou um texto de Heine como epígrafe de seu livro Os Escravos, onde o alemão ordenou: “Porém uma espada deveis colocar sobre meu caixão; pois fui um bravo soldado na guerra de libertação da humanidade”.
É ao Navio Negreiro que o personagem de Memorial de Aires, de Machado de Assis, refere-se quando narra o dia da aprovação da Lei Áurea: “Ainda bem que acabamos com isto. Era tempo. Embora queimemos todas as leis, decretos e avisos, não poderemos acabar com os atos particulares, escrituras e inventários, nem apagar a instituição da história, ou até da poesia. A poesia falará dela, particularmente naqueles versos de Heine, em que o nosso nome está perpétuo. Neles conta o capitão do navio negreiro haver deixado trezentos negros no Rio de Janeiro, onde ‘a casa Gonçalves Pereira’ lhe pagou cem ducados por peça. Não importa que o poeta corrompa o nome do comprador e lhe chame Gonzales Perreiro; foi a rima ou a sua má pronúncia que o levou a isso. Também não temos ducados, mas aí foi o vendedor que trocou na sua língua o dinheiro do comprador”.
No ano passado, André Vallias traduziu, “com alta qualidade estética”, na opinião de Augusto de Campos, 120 poemas  e os publicou pela Perspectiva com o título Heine, Hein? Poeta dos Contrários. O livro traz também informações sobre a vida e a obra do alemão, inclusive esta passagem sobre o encontro com os recém-casados Jenny e Karl Marx, na França: “A identificação foi imediata, e este logo estaria frequentando a residência do jovem casal, e contribuindo com poemas para as publicações de Marx e de seus colaboradores, em Paris: os Cadernos Franco-Alemães, primeiramente, e depois o jornal Avante!, onde sairiam, em primeira mão, alguns de seus poemas políticos mais famosos, como ‘Ratos Retirantes’, ‘Miserê’, ‘Lenda do Castelo’, ‘Esperem Só’ e ‘Os Tecelões da Silésia’. Este último, inspirado numa greve violentamente reprimida, foi distribuído como panfleto aos milhares, na região do incidente, e virou um dos hinos mais populares do movimento operário internacional, graças à tradução para inglês feita por Friedrich Engels. Quando o jornal Avante! foi embargado, por exigência do governo prussiano, e seus diretores expulsos da França, Marx se despediu do poeta com estas palavras saudosas: ‘De tudo, em pessoas, que aqui eu deixo, a herança heineana é a que mais me aflige. Como gostaria de colocá-lo em minha bagagem’”.
Auguste Cornu, na biografia que escreveu de Marx e Engels, diz que Marx era um dos conselheiros de Heine. Mas a influência era recíproca. Quando escreveu, na Crítica da Filosofia de Direito de Hegel (1843), que “a religião é o ópio do povo”, Marx ecoava o escrito de Heine em Ludwig Börne (1840): “Bendita seja uma religião que derrama no amargo cálice da humanidade sofredora algumas doces e soporíferas gotas de ópio espiritual, algumas gotas de amor, fé e esperança”.
 Heine foi aluno, dentre outros, do filósofo Georg Hegel, conviveu com Balzac, Dumas, Chopin, Liszt. Foi o primeiro a chamar a atenção para o caráter revolucionário da filosofia clássica alemã, incluída a dialética de Hegel. Para ele, a história da filosofia é a história da luta entre o espiritualismo, que ele combatia, e o sensualismo, ao qual aderiu, conforme registrou em Contribuição à História da Religião e da Filosofia na Alemanha (1834). Nesse livro, vincula a crítica da religião e do idealismo com a luta contra o feudalismo, a monarquia e o espírito burguês vulgar e estreito. Em A Escola Romântica (1836), tratou o Renascimento como rebelião contra a concepção medieval do mundo: “É possível que os pintores da Itália hajam polemizado com o clero com mais eficácia que os teólogos saxões. A carne que floresce nas pinturas de Tiziano é toda protestantismo. As costas de sua Vênus são teses muito mais sólidas que as que foram pregadas pelo frei alemão” (refere-se a Lutero) “no portal de Wittenberg”. 
Heine trocou a Alemanha por Paris em 1831, buscando maior liberdade de espressão. Na Alemanha era tido como subversivo e censurado. Escreveu sobre a censura, na tragédia Almansor (1821):
Foi só o prelúdio; onde queima livros,
No final, também hão de queimar homens.
Criticou assim a abordagem da lírica romântica do século XIX, impotente diante das injustiças sociais: “Oh, mundo formoso: sois repugnante.” Para ele, o futuro da humanidade está ligado à realização do direito das massas populares à satisfação de suas necessidades e interesses materiais. “O pensamento vai à frente da ação, como o raio do trovão”, escreveu.
Polemizou com os “grandes filósofos alemães”: “... queiram eles levar em conta que o pouco que digo é completamente claro e inteligível, enquanto as suas obras, ainda que tão fundamentadas, incomensuravelmente fundamentadas, tão profundas, estupendamente profundas, são incompreensíveis. Do que vale ao povo o celeiro para o qual não tem a chave? O povo está faminto de saber, e agradece o pedacinho de pão do espírito que partilho com ele honestamente”.
Morreu em Paris, em 17 de fevereiro de 1856, devido às dosagens excessivas de morfina que usava para combater a sífilis. Partilhemos e compartilhemos generosamente sua obra e seus ideais.

* Carlos Pompe é jornalista, comunista revolucionario, editor do Vermelho/DF e curioso do Mundo e amante da poesia e da vida!!

Nenhum comentário: