segunda-feira, fevereiro 20, 2012

Carnaval na luta pela Liberdade!





Carlos Pompe*
O Carnaval é considerado uma das festas mais alegres do planeta. Descartando
festas anteriores do Antigo Egito e da civilização greco-romana, suas precursoras, as
referências ao Carnaval só aparecem a partir do século XI, quando a Igreja instituiu a
Quaresma. “Daí em diante, a festa vai tomar várias formas até que, no século XIX, a
burguesia parisiense ‘inventa’ o Carnaval tal como o concebemos atualmente”, conta
Felipe Ferreira nO Livro de Ouro do Carnaval Brasileiro.


Segundo esse autor, o Entrudo, festa trazida pelos portugueses e denunciada pelo Santo
Ofício em Pernambuco em 1533, virou mania nacional brasileira no início do século
XIX, mas após a Independência se buscou vincular a festa à modernidade francesa.
Nos anos 1840 foram promovidos, em várias cidades brasileiras, bailes carnavalescos
à francesa. Dez anos depois, após idas e vindas de proibições policiais, “a presença de
pessoas fantasiadas pelas ruas das cidades brasileiras durante os dias de folia marcaria
um passo importante no surgimento daquilo que mais tarde ficaria conhecido como
Carnaval de Rua”, registra Felipe.


O livro informa que grupos semiorganizados passaram a ser incorporados à folia, o
que levou um dos jornais do Rio de Janeiro, em 1890, a lamentar a falta de animação
carnavalesca na rua do Ouvidor, onde “somente” conjuntos populares negros se
apresentaram. A partir do início do século passado, as ruas do centro do Rio de Janeiro
foram utilizadas pelas sociedades carnavalescas de elite e pelos grupos populares que,
entre disputas e diálogos, estruturaram “a festa que seria o modelo para todo o país” ao
longo do século.


Após a ditadura militar, imposta com o golpe de 1964, o Carnaval passou a representar,
na temática de vários artistas da música popular, a liberdade e o anseio pelo fim do
regime obscurantista. A Marcha da Quarta-Feira de Cinzas, de Vinícius de Moraes
e Carlos Lyra, composta em 1963, ganhou novo significado a partir de 1965, como
contou Lyra em uma de suas apresentações:


Acabou nosso carnaval
Ninguém ouve cantar canções
Ninguém passa mais brincando feliz
E nos corações
Saudades e cinzas foi o que restou


Pelas ruas o que se vê
É uma gente que nem se vê
Que nem se sorri
Se beija e se abraça
E sai caminhando
Dançando e cantando cantigas de amor


E no entanto é preciso cantar
Mais que nunca é preciso cantar
É preciso cantar e alegrar a cidade...


Ouça a música aqui: http://www.youtube.com/watch?v=Y88EguvjlVM


Em 1965, Chico Buarque lançou o seu Sonho de um Carnaval, cantando:


No carnaval, esperança
Que gente longe viva na lembrança
Que gente triste possa entrar na dança
Que gente grande saiba ser criança.


Aqui, uma bela gravação: http://www.youtube.com/watch?v=Eb12Enr2BR0


Conforme os ditadores foram cometendo crimes contra os brasileiros progressistas e
democratas, mudou também a abordagem do Carnaval no cancioneiro. Pouco depois
do Ato Institucional n° 5, o Império Serrano politizou a avenida Presidente Vargas,
onde ocorriam os desfiles antes da existência do Sambódromo no Rio. Em 1969 levou
o samba Heróis da Liberdade, de Silas de Oliveira, Mano Décio da Viola e Manuel
Ferreira, tratando da Inconfidência Mineira e abolição e fazendo referência ao Hino da
Independência, atribuído a Pedro I. Por pressão dos censores, Silas substituiu a palavra
revolução por “evolução” no trecho abaixo:


Ao longe soldados e tambores


Alunos e professores


Acompanhados de clarim


Cantavam assim


Já raiou a liberdade


A liberdade já raiou


Essa brisa que a juventude afaga


Essa chama


Que o ódio não apaga pelo universo


É a evolução em sua legítima razão.


Vale a pena assistir, aqui: http://www.youtube.com/watch?v=6m_-
i0LzjQg&feature=related


Em 1972, Chico Buarque fez a trilha sonora de um filme de Caca Diegues, sobre um
grupo de artistas sem sucesso que consegue um contrato para uma apresentação em


homenagem a um rei que assistirá ao Carnaval no Rio. A música anuncia:


Quem me vê sempre parado, distante
Garante que eu não sei sambar
Tô me guardando pra quando o Carnaval chegar
Eu tô só vendo, sabendo, sentindo, escutando
E não posso falar
Tô me guardando pra quando o Carnaval chegar


Veja o gingado e a espontaneidade do Chico aqui: http://www.youtube.com/watch?
v=zu2B2z9XRxQ


Dez anos após o golpe, Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro anunciaram, no seu
Agora é Portela 74:


Conte comigo no seu Carnaval
Tô me guardando contra o mesmo mal
A decisão eu acho que é geral
É cada vez maior o pessoal.


A canção, na interpretação do MPB4, aqui: http://www.youtube.com/watch?
v=bHliJFHO_q8


Finda a ditadura e a censura, a repressão e condenação à festa popular continuou
e continua por parte de religiosos, em especial a alta hierarquia católica, sempre
pressionando governantes e autoridades a proibirem qualquer abordagem que
considerem em contradição com seus dogmas. Foi assim que o alto comando católico,
no Rio de Janeiro, proibiu que uma réplica do Cristo Redentor, vestido de mendigo,
fosse colocada num carro alegórico, por Joãosinho Trinta, em 1989. Sempre criativo,
o carnavalesco cobriu a imagem com plástico preto e afixou-lhe um cartaz: “Mesmo
proibido, olhai por nós”.


Cenas do desfile aqui: http://www.youtube.com/watch?v=ykt0KMvgbDU


Hoje, como em meados do século XIX e, provavelmente, como em meados do século
XXI, há os que reclamam que já não se faz mais Carnaval como os de antigamente. Mas
a festa está aí, para quem gosta, e o feriado também, para quem prefere o repouso.


Bom Carnaval para todos!


Carlos Pompe é comunista, revolucinario, cronista e curioso  do Mundo e colunita do VERMELHO!
@Carlopo

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