Parcas Medalhas
JAIME
SAUTCHUK (*)
As Olimpíadas de Londres
renderam ao Brasil 17 medalhas, sendo três de ouro. Merecem parabéns os atletas que as
conseguiram. Contudo, o que se pode dizer é que o resultado desses jogos, para
nós, foi pífio. São honrosas as premiações obtidas, mas, convenhamos, foram
parcas diante do esperado.
Primeiro, porque as leis
surgidas no Brasil (Agnelo/Piva, Bolsa-Atleta e outras) e as políticas
implantadas a partir da era Lula sempre indicaram um rumo promissor. A começar
pela criação do Ministério do Esporte, que antes era misturado com turismo, não
sabemos por quê.
Com isso, o dinheiro aplicado
em esporte cresceu em mais de 30 vezes, administrado principalmente pelo Comitê
Olímpico Brasileiro (COB), uma entidade privada, como a CBF no futebol. E há
também o patrocínio de empresas estatais, como Banco do Brasil, ECT, Caixa e
Petrobrás. É dinheiro é público. Só que mal aplicado, pelo que se vê.
O presidente do COB, Carlos Arthur Nuzmann,
disse, ao avaliar o desempenho brasileiro em Londres, que “é preciso
diversificar as modalidades em que atuamos”. Descobriu a pólvora, o veterano
dirigente dos esportes olímpicos.
Também o secretário-executivo
da entidade, Marcus Vinícius Freire, o Marcão, lamentou o resultado muito abaixo
do esperado, mas sem explicar direito. Ambos são originários do vôlei,
modalidade em que concentram investimentos, mas nem mesmo aí nossa pontuação
foi de total agrado, já que ficamos com a prata no masculino.
Mas esse meio fracasso vem
num momento em que o País está em campanha eleitoral. E suscita, pois, o debate
no plano municipal. Os candidatos devem ter a consciência de que o esporte não
é um penduricalho nas políticas públicas. É, ao contrário, uma atividade
essencial, até porque está imbricada com educação e saúde, pelo menos.
E aí é que o bicho pega. Por
mais que haja esforço no plano federal, quando chega lá na base, nas escolas,
nas comunidades, o que se vê é um descaso completo. Os atletas surgem por
acaso, por esforço pessoal, não como fruto de atividade massificada, em que
toda a criança já traga com ela essa possibilidade de se desenvolver.
Há, no entanto, uma série de
fatores que tornam complexa a mudança de mentalidade a respeito do esporte no
Brasil. A começar pela legislação que regulamenta a atividade dos profissionais
da educação física.
A Lei 9696, de 1998, que
regulamenta essa profissão, cria uma divisão de áreas. Uns profissionais podem
atuar nas escolas formais da rede de ensino, outros podem atuar nas academias,
clubes etc. Essa divisão é reforçada na própria universidade, que tem, em
verdade, dois cursos distintos: o de graduação (bacharelado) e o de
licenciatura.
Quando caem no mercado de
trabalho, esses profissionais são subordinados a normas diferentes. Os de
licenciatura são regidos pelas regras do Ministério da Educação; os outros,
pelas do Conselho Federal de Educação Física. Na maior parte dos países, como
Cuba, por exemplo, não existe essa diferenciação.
No dia-a-dia, ocorre o
seguinte. Pela legislação, um professor de uma escola da rede pública de uma
cidade qualquer não pode ser, ao mesmo tempo, treinador de um time de futebol
local. Não pode sequer desenvolver atividades de lazer com outras crianças. A
tese que norteia isso é a de que, caso contrário, esse professor estaria
“roubando” vaga de alguém. Parece um absurdo, mas esse é um problema real.
Na América Latina, há
exemplos de forte desenvolvimento da atividade esportiva. Quando assumiu o
governo da Venezuela, o presidente Hugo Chaves fez um acordo com Cuba e
contratou cerca de 1.000 técnicos em educação física e esportes. Essa gente se
espalhou pelo país, em centros esportivos, escolas e entidades populares. E os
resultados são visíveis, em especial nos esportes de rendimento, olímpicos. Mas
até no futebol.
Do ponto de vista
quantitativo, o caso brasileiro é bem mais simples do que o venezuelano. As
universidades brasileiras jogam no mercado, pelo menos, 30 mil novos
profissionais de educação física por ano. Ou seja, o Brasil está bem servido de
pessoal para atuar na massificação das atividades esportivas.
O problema é que grande parte
dos profissionais que se formam atende ao chamado mercado. Eles vão atuar na
área de fitness (condicionamento físico), nas academias de ginástica ou
no atendimento personalizado a fregueses endinheirados. Prevalece a visão o
esporte como privilégio de poucos.
Há outro contingente que vai
para as escolas, mas estas também não estão voltadas para a formação de
atletas. Fica, então, um vazio entre estes dois grandes nichos de mercado de
trabalho (escola e fitness).
Existem vários outros
problemas, como o uso dos espaços urbanos para esporte e lazer. Mesmo em cidades
pequenas do interior, é comum vermos áreas que eram campos de futebol de várzea
serem transformadas em estacionamentos de carros ou prédios comerciais. As
prefeituras, de um modo geral, não investem nessas áreas, que poderiam ser
centros de esporte e lazer, com monitoria profissional.
Apesar de ter dinheiro, o COB
não tem uma política efetivamente de base. De todo modo, o momento é oportuno.
Basta assegurar que o tema esporte não seja somente discurso de campanha, mas
que sejam asseguradas medidas efetivas.
Só assim poderemos chegar a
eventos internacionais com um volume de atletas competitivos. Não apenas com alguns
abnegados ou adeptos de modalidades privilegiadas pelas autoridades do setor,
como o vôlei.
*Jaime Sautchuk é jornalista, ambientalista e homem preocupado com as coisas do Brasil
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