Competência
nós Temos
JAIME
SAUTCHUK
(*)
Foram mais de 500 mil urnas
eletrônicas que chegaram ao seu destino no prazo certo e funcionaram direitinho
tanto no centro de São Paulo quanto na mais recôndita comunidade da Amazônia.
Milhares de pessoas trabalhando para que quase 140 milhões de brasileiros
tivessem a possibilidade de votar. E para que duas horas depois de fechadas as
urnas o país já soubesse seus resultados.
Foi encantador o sucesso das
eleições municipais do último domingo, sob a coordenação do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE). Ocorrências de quebras de regras, como a boca de urna ilegal,
e falhas em equipamentos foram tão poucas e tão prontamente resolvidas que
passaram despercebidas. E a eficácia do sistema não deixou margens a qualquer
dúvida sobre os resultados das urnas.
É certo que o sistema
eleitoral brasileiro, de pouca idade, é tido hoje como o mais moderno e
confiável do mundo. O que se fez agora foi introduzir novos melhoramentos que
facilitam o processo para o eleitor e ao mesmo tempo o tornam mais ágil e
seguro para quem cuida da parte operacional, o que inclui a segurança das
informações e das pessoas envolvidas no gigantesco evento.
É certo que a abstenção foi
além do que se esperava e das marcas históricas. A média nacional de eleitores
que deixaram de votar foi de 16% e, em cidades como São Luiz, Salvador e São
Paulo chegou a 19%. No Rio, foi a 20%. Em 2008, a média nacional foi de 14% e
já era tida como alta.
A nova legislação eleitoral,
que restringe a ação de cabos eleitorais, por exemplo, talvez tenha contribuído
para a queda na mobilização. Mas é um mal necessário. A mobilização se corrige,
já corrupção, como o voto de cabresto, é mais complicada.
Na Venezuela, que teve
eleições presidenciais no mesmo dia e onde o voto é facultativo, a abstenção
foi de apenas 12%. E levando-se em conta que o vizinho país implantou de vez a
tecnologia brasileira de urnas eletrônicas e sistema de apuração. Também lá,
duas horas após o fechamento das urnas sabia-se o resultado, que deu vitória ao
presidente Hugo Cháves.
No frigir dos ovos, portanto,
tira-se disso um sentimento de que nós, brasileiros, temos capacidade de organizar
qualquer tipo de evento, nas dimensões que se fizerem necessárias. E isso vale,
pois, para os eventos esportivos que vêm por aí, em especial a Copa do Mundo de
Futebol, em 2014, e as Olimpíadas, em 2016.
Ao fazermos uma analogia
entre as eleições e os eventos esportivos, entretanto, vemos que neste outro
setor o buraco é mais embaixo. Também nos esportes, quem traça as linhas de
ação e financia os eventos é o poder público. Mas, neste caso, quem põe a coisa
para funcionar são as entidades esportivas, ainda eivadas de cartolas
incompetentes e corruptos, mas ricos. E que se agarram aos seus poleiros com
unhas e dentes, décadas a fio.
No futebol, o comando da
Confederação Brasileira de Futebol (CBF) é do histórico antro de cartolas da
dinastia de João Havelange e seu ex-genro Ricardo Teixeira, que há seis décadas
mantêm a entidade nas listas de fichas sujas. As falcatruas que praticam,
usando entidades como biombos, são por demais conhecidas e condenadas mundo
afora, mas não há quem os coloque atrás das grades.
Nos esportes olímpicos, quem
dá as cartas por aqui é o Comitê Olímpico Brasileiro (COB), há décadas também
controlado por outra dinastia, a de Carlos Arthur Nuzmann. Aliás, seu grupo
acaba de ser reeleito, em pleito de chapa única, para mais um mandato, que vai
até 2017. Ou seja, até depois das Olimpíadas de 16.
Os cerca de R$ 550 milhões
investidos pelo TSE nestas eleições municipais – o que mereceu críticas de
diversos setores -- são fichinha perto do que se gasta em esportes. Mesmo
levando-se em conta que parte desses recursos vai para a sustentação de atletas
já formados nas modalidades olímpicas. Mas, ainda faltam políticas de
universalização do acesso, que deveria ocorrer principalmente na escola.
Em ambos os casos, as
atividades e os atletas envolvidos nas competições são frutos de escolha dos
cartolas. No futebol, a prioridade é a seleção principal, onde corre muita
grana. Até mesmo no comércio de jogadores. Afinal, um convocado tem seu valor
de passe multiplicado por muitas vezes de uma hora para outra.
É público e notório o jogo de
interesses que envolvem a convocação de jogadores para selecionados. Isso
explica, também, porque o Brasil armazena bons resultados em copas do mundo,
por exemplo, mas não consegue ganhar campeonatos de categorias inferiores ou
mesmo faturar o esperado ouro olímpico no futebol.
Nos esportes olímpicos é a
mesma coisa. Algumas modalidades são tratadas com muito mimo e muita grana. É o
caso do vôlei, por exemplo, esporte de origem de Nuzmann e da maior parte dos
demais dirigentes do COB. E que também tem um forte mercado de jogadores e
jogadoras.
O atleta individual (um
fundista, por exemplo), contudo, surge ao acaso, por esforço próprio e não por
mérito de alguma política que de fato torne o acesso universal. São meninos e
meninas laçados ao acaso, por pura sorte.
Ou seja, para que a gente
demonstre nossa competência também em eventos esportivos, há que se jogar
pesado com essas entidades e seus cartolas.
Ou, então, convoquemos o TSE!
*Jaime Sautchuk é jornalista,
escritor, lutador pela Paz, ambientalista e revolucionário de primeira hora
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